Identidade
Nacional
SÓ DE SACANAGEM ( Elisa Lucinda)
Meu coração
está aos pulos! Quantas vezes minha esperança será posta à prova?
Por quantas
provas terá ela que passar? Tudo isso que está aí no ar: malas, cuecas que voam
entupidas de dinheiro, do meu dinheiro, do nosso dinheiro que reservamos
duramente pra educar os meninos mais pobres que nós, pra cuidar gratuitamente
da saúde deles e dos seus pais.
Esse
dinheiro viaja na bagagem da impunidade e eu não posso mais. Quantas vezes, meu
amigo, meu rapaz, minha confiança vai ser posta à prova? Quantas vezes minha
esperança vai esperar no cais?
É certo que
tempos difíceis existem pra aperfeiçoar o aprendiz, mas não é certo que a
mentira dos maus brasileiros venha quebrar no nosso nariz.
Meu coração
tá no escuro.
A luz é
simples, regada ao conselho simples de meu pai, minha mãe, minha avó e os
justos que os precederam:
" - Não
roubarás!"
" - Devolva
o lápis do coleguinha!"
" -
Esse apontador não é seu, minha filha!"
Ao invés
disso, tanta coisa nojenta e torpe tenho tido que escutar. Até habeas-corpus
preventivo, coisa da qual nunca tinha visto falar, e sobre o qual minha pobre
lógica ainda insiste: esse é o tipo de benefício que só ao culpado interessará.
Pois bem, se
mexeram comigo, com a velha e fiel fé do meu povo sofrido, então agora eu vou
sacanear: mais honesta ainda eu vou ficar. Só de sacanagem!
Dirão:
“ - Deixa de
ser boba, desde Cabral que aqui todo o mundo rouba.”
E eu vou
dizer: “- Não importa! Será esse o meu carnaval. Vou confiar mais e outra vez.
Eu, meu irmão, meu filho e meus amigos. Vamos pagar limpo a quem a gente deve e
receber limpo do nosso freguês. Com o tempo a gente consegue ser livre, ético e
o escambau.”
Dirão:
" - É
inútil, todo o mundo aqui é corrupto, desde o primeiro homem que veio de
Portugal”.
E eu direi: “- Não admito! Minha esperança é imortal!”
E eu repito,
ouviram? IMORTAL!!!
Sei que não dá pra mudar o começo, mas, se a
gente quiser, vai dar pra mudar o final.
Raízes do Brasil – Sérgio Buarque
de Holanda
Raízes
do Brasil foi publicado em 1936, e causou grande impacto pois discute o choque
entre a tradição e modernidade na sociedade brasileira. Para tal, ele busca nas
raízes desta sociedade uma explicação para o atraso social existente no país,
produzindo, ao mesmo tempo, hipóteses para uma possível superação deste
retrocesso.
Segundo ele, a formação do Brasil
contemporâneo está diretamente ligada às origens da sociedade brasileira, ou
seja, está atrelada à colonização e ao seu legado cultural, político e
institucional. Assim, o tradicionalismo da política brasileira vem de seu
passado ibérico, ou seja, de suas raízes.
Sérgio
Buarque percebe que a modernização é impedida pela herança de uma tradição
ibérica e que a absorção das instituições portuguesas, dotadas de uma
historicidade própria, traz consigo uma incompatibilidade com o ideal de
desenvolvimento democrático e modernizado, evidenciando uma incapacidade de
mudança adaptativa as necessidades existentes. É através desta compreensão que
ele formula alguns conceitos fundamentais de sua obra. O primeiro conceito que
ele usa para explicar a sociedade através de suas origens é a cultura da personalidade. Para ele, a
cultura da personalidade é a frouxidão de laços sociais que implicam em formas
de organização solidária e ordenada.
Sérgio
aborda que as relações em Portugal não advêm do mérito, mas sim do privilégio,
do status.
A
segunda característica fundamental ao entendimento da sociedade contemporânea
através de suas raízes é a ética da
aventura. Para este estudioso, a colonização do Brasil foi promovida pelo
espírito do português aventureiro, que exibe a mobilidade e a adaptabilidade,
que nega a estabilidade e o planejamento, que corrobora com a cultura do ócio e
se distingue do tipo trabalhador, e de sua ética do trabalho, que preza pelo
“esforço sem perspectiva de rápido proveito material” (BUARQUE, Sérgio, 2000).
Ao
comparar as cidades portuguesas com as espanholas, define que o espanhol é um
ladrilhador, que constrói suas cidades de forma a racionalizar o espaço. Ao
contrário, o português é apenas um semeador, que sai semeando cidades
irregulares que se confundem com a paisagem. Também é através dessa negação do
trabalho, somada a falta de planejamento, a uma demanda de mercado e, a pequena
população do reino, que aparece um dos principais elementos da colonização
portuguesa no Brasil, a escravidão do africano.
É a
partir desta outra herança ibérica que este estudioso propõe a quarta
consideração sobre o tradicionalismo brasileiro, o homem cordial. Por sua vez, este é o símbolo da relação social
sem formalidade, que leva para a vida pública a vida privada, ao propor acesso
à existência política através de relações sociais de proximidade e afetividade.
O homem cordial não se dá com a relação fria do Estado, e por isso essa
instituição é tão fraca entre os ibéricos. Além disso, essa cordialidade não pressupõe
bondade, mas apenas identifica que o homem cordial não se guia pela
racionalidade, e sim pelas suas emoções. Assim, essa emotividade pode ser boa
ou má, apenas não será guiada pela razão.
LEIA
MAIS EM: http://www.revistacontemporaneos.com.br/n3/pdf/sergiobuarque.pdf
Proposta
de Redação: Escreva um texto
dissertativo argumentativo relacionando as faces do Brasil do século XXI com
suas raízes históricas, mas seguindo o argumento final do texto da Elisa
Lucinda.
Todo povo tem na
sua evolução um certo “sentido”. Este se percebe não nos pormenores de sua
história, mas no conjunto dos fatos e acontecimentos essenciais que a
constituem. Desta forma, entre séculos de exploração, anos de repressão e com
abismos ainda não preenchidos, a nação brasileira busca produzir, no presente,
formas clarividentes para um futuro promissor. Visto que, nunca houve condições
geográficas e técnicas para a produção de outra realidade como no limiar deste
século.
O processo de colonização brasileiro
acabou por permitir que se esboçasse na identidade do país uma nacionalidade
diferente do modelo europeu e relativamente nova em termos sociais. Sem que
isso significasse, contudo, autonomia e dinâmica própria para a sociedade em
construção e mesmo após a sua independência política. Assim, a formação do
Brasil contemporâneo está diretamente ligada às origens da sociedade
brasileira, ou seja, está atrelada à colonização e ao seu legado cultural,
político e institucional.
A modernização é
impedida pela herança histórica que a nação possui, trazendo consigo uma
incompatibilidade com o ideal de desenvolvimento democrático e modernizado, evidenciando
uma incapacidade de mudança adaptativa as necessidades existentes. Não
obstante, o homem político é cordial, transportando as condutas utilizadas na
esfera privada para a esfera pública, criando uma série de impasses para a sua
configuração, independente, no Brasil, e aponta para a própria fraqueza da
organização social e política do país.
A utopia que foi
delineada por Thomas Morus e reiterada, nesse século, por Galeano sugere que
mesmo que não possamos adivinhar o tempo que virá, temos ao menos, o direito de
imaginar o que queremos que seja. No caso do Brasil, mesmo sabendo que não há a
possibilidade de mudar o começo, a produção de melhorias no presente pode
garantir uma mudança no final.
Thainá Caló
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