Primeiras Palavras:
Não são só romances obrigatórios que são cobrados na prova da UESC então que tal treinar umas questões de interpretação. Só confira o Gabarito depois tá.
Mara Rute Lima
Chegou e eu esperei ainda. Afinal, fui
levado à sua presença. Ao lado, em uma mesa mais baixa, lá estava o Capitão
Viveiros, o tal escrivão, muito solene, com a pena atrás da orelha, o seu olhar
cúpido e a sua papada farta. O delegado pareceu-me um medíocre bacharel, uma
vulgaridade com desejos de chegar a altas posições; no entanto, havia na sua
fisionomia uma assustadora irradiação de poder e de força. Talvez se sentisse tão
ungido da graça especial de mandar, que na rua, ao ver tanta gente mover-se
livremente, havia de considerar que o fazia porque ele deixava.Interrogou-me de
mau humor, impaciente, distraído, às sacudidelas. Repisava uma mesma pergunta;
repetia as minhas respostas.
BARRETO, Lima. Recordações do escrivão Isaías
Caminha. São Paulo: Ática, 1994. p. 63. (Série Bom Livro).
1. Com
base no fragmento inserido na obra, está correto o que se afirma na alternativa
01) A mudança de condição de vida de
Isaías, quando passa de contínuo a repórter no jornal “O Globo”, provoca uma alteração
radical em seus conceitos sobre os outros e sobre si mesmo.
02) O escrivão Isaías Caminha considera os
literatos com os quais conviveu, quando t rabalhou na
redação de um jornal, como modelos a imitar no seu fazer literário.
03) O narrador escreve as suas
“Recordações” com o intuito de alcançar a glória literária e, com ela, a
ascensão social.
04) O delegado representa a autoridade que,
movida pelo preconceito, exerce, de forma arbitrária, o poder.
05) O narrador-personagem, ao descrever o
delegado, revela-se imparcial.
[...] Considerei-me feliz no lugar de
contínuo da redação do O Globo. Tinha atravessado um grande braço de mar, agarrara-me
a um ilhéu e não tinha coragem de nadar de novo para a terra firme que barrava
o horizonte a algumas centenas de metros. Os mariscos bastavam-me e os insetos já
se me tinham feito grossa a pele...
De tal maneira é forte o poder de nos
iludirmos, que um ano depois cheguei a ter até orgulho da minha posição.
Senti-me muito ma i s q u e um c
o n t í n u o q u a l q u e r, me smo
ma i s q u e um contínuo de ministro. As conversas da
redação tinham-me dado a convicção de que o doutor Loberant era o homem mais
poderoso do Brasil; fazia e desfazia ministros, demitia diretores, julgava
juízes e o presidente. Logo ao amanhecer, lia o seu jornal, para saber se tal
ou qual ato seu tinha tido o placet desejado do doutor Ricardo.
BARRETO, Lima. Recordações do escrivão
Isaías Caminha. 3. ed. São Paulo: Ática, 1994. p. 99.
2. O
texto, articulado com a obra, permite considerar correta a alternativa
01) Isaías Caminha revela-se um ser humano
desprovido de qualquer vaidade.
02)
O n a r r a d o r u t i l i z a , n o
s e u r e l a t o , u m a
l i n g u a g e m essencialmente objetiva e precisa.
03) O narrador atribui tão somente aos
outros a não realização de seus projetos de vida.
04) O narrador reconhece, na narrativa, a
atuação da imprensa de seu tempo como
marcada pela ética e pelo compromisso com o social.
05) Isaías, através do relato de sua trajetória
de vida, mostra o ambiente social como discriminador de pessoas pobres e de
negros e mulatos.
3. Reconhecido há tempos, dentro e fora do
Brasil, como manifestação artística legítima e pública, o grafite vem sendo
visto também como um elemento relevante do espaço urbano, pois nele realiza
sucessivas intervenções.
3. Com base nessa
ideia e no foco da matéria jornalística, é correto afirmar que atualmente o
grafite
(A)
estimula e aprofunda o desemprego entre a população jovem urbana.
(B)
potencializa e provoca a revolta de grupos sociais oprimidos.
(C)
renova e estetiza diversos trechos da paisagem urbana.
(D)
fortalece e antecipa o aspecto marginal das pichações.
(E)
abandona e contesta valores estéticos externos à cultura nacional.
4. Leia o texto:
TEXTO
VII
Senhora
Dona Bahia,
nobre
e opulenta cidade,
madrasta
dos naturais,
e dos
estrangeiros madre:
Dizei-me
por vida vossa
em que
fundais o ditame
de
exaltar os que aqui vêm,
e
abater os que aqui nascem?
Se o
fazeis pelo interesse
de que
os estranhos vos gabem,
isso
os paisanos fariam
com
conhecidas vantagens.
E
suposto que os louvores
em
boca própria não valem,
se tem
força esta sentença,
mor
força terá a verdade.
O
certo é, pátria minha,
que
fostes terra de alarves,
e inda
os ressábios vos duram
desse
tempo e dessa idade.
Haverá
duzentos anos,
nem
tantos podem contar-se,
que
éreis uma aldeia pobre
e hoje
sois rica cidade.
Então
vos pisavam índios,
e vos
habitavam cafres,
hoje
chispais fidalguias,
arrojando
personagens.
Gregório de Matos
Vocabulário
alarves
- que ou quem é rústico, abrutado, grosseiro,
ignorante; que ou o que é
tolo, parvo, estúpido.
ressábios
- sabor; gosto que se tem depois.
cafres - indivíduo de raça negra.
4. Todas as afirmativas sobre a construção
estética ou a produção textual do poema de Gregório de Matos
(Texto
VII) estão adequadas, EXCETO uma. Assinale-a.
(A)
Existem antíteses, características de textos no período barroco.
(B) Há
uma personificação, pois a Bahia, ser inanimado, é tratada como ser vivo.
(C) A
ausência de métrica aproxima o poema do Modernismo.
(D) O
eu lírico usa o vocativo, transformando a Bahia em sua interlocutora.
(E) Há
diferença de tratamento para os habitantes locais e os estrangeiros.
5. Leia o texto:
Modinha do exílio
Os
moinhos têm palmeiras
Onde
canta o sabiá.
Não
são artes feiticeiras!
Por
toda parte onde eu vá,
Mar e
terras estrangeiras,
Posso
ver mesmo as palmeiras
Em que
ele cantando está.
Meu
sabiá das palmeiras
Canta
aqui melhor que lá.
Mas,
em terras estrangeiras,
E por
tristezas de cá,
Só à
noite e às sextas-feiras.
Nada
mais simples não há!
Canta
modas brasileiras.
Canta
– e que pena me dá!
Ribeiro Couto
5. Os versos dos poetas modernistas e
românticos apresentam relação de intertextualidade com o poema de Ribeiro
Couto, EXCETO em uma alternativa. Assinale-a.
(A)
“Vou-me embora pra Pasárgada / Lá sou amigo do rei / Lá tenho a mulher que eu
quero / Na cama que escolherei” (Manuel Bandeira)
(B)
“Dá-me os sítios gentis onde eu brincava / Lá na quadra infantil; / Dá que eu
veja uma vez o céu da pátria, / O céu do meu Brasil!” (Casimiro de Abreu)
(C)
“Minha terra tem macieiras da Califórnia / onde cantam gaturamos de Veneza. /
Os poetas da minha terra / são pretos que vivem em torres de ametista,” (Murilo
Mendes)
(D)
“Ouro terra amor e rosas / Eu quero tudo de lá / Não permita Deus que eu morra
/ Sem que volte para lá” (Oswald de Andrade)
(E)
“Em cismar, sozinho, à noite, / Mais prazer eu encontro lá; / Minha terra tem
palmeiras, / Onde canta o Sabiá.” (Gonçalves Dias)
6. Pode-se afirmar sobre o poema de Ribeiro
Couto que
(A)
canta modas brasileiras só à noite e às sextas-feiras, porque as artes
feiticeiras são praticadas pelo eu lírico em seu exílio.
(B)
tem como objetivo expressar a depressão do eu lírico em terra estrangeira, mas
também capta os sentimentos do poeta durante o seu exílio.
(C)
tem como referência original o tema e a métrica da “Canção do exílio”, mas
reelabora as referências românticas com a linguagem modernista.
(D)
tem a finalidade de descrever detalhadamente os moinhos com palmeiras onde
canta o sabiá, conforme pregava o Realismo.
(E)
expressa a simplicidade da linguagem do eu lírico, que prefere cantar modinhas
brasileiras no exílio a retornar ao Brasil.
Leia o texto:
Tudo o
que aqui escrevo é forjado no meu silêncio e na penumbra. Vejo pouco, ouço
quase nada.
Mergulho
enfim em mim até o nascedouro do espírito que me habita. Minha nascente é
obscura. Estou escrevendo porque não sei o que fazer de mim. Quer dizer: não
sei o que fazer com meu espírito. O corpo informa muito. Mas eu desconheço as
leis do espírito: ele vagueia. Meu pensamento, com a enunciação das palavras
mentalmente brotando, sem depois eu falar ou escrever — esse meu pensamento de palavras
é precedido por uma instantânea visão sem palavras, do pensamento — palavra que
se seguirá, quase imediatamente — diferença espacial de menos de um milímetro.
Antes de pensar, pois, eu já pensei.
Clarice
Lispector. Um sopro de vida.
7.
Assinale a opção que corresponde ao pensamento de Clarice Lispector
sobre a criação literária, no texto acima.
(A) A
obra em si mesma é tudo: se te agradar, fino leitor, pago-me da tarefa; se te
não agradar, pago-te com um piparote e adeus.
(B)
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
(C)
Vozes da infância, contai a história da vida boa que nunca veio.
(D)
Pensar é a concretização, materialização do que se pré-pensou.
(E) O
poeta é um fingidor. Finge tão completamente que chega a fingir que é dor a dor
que deveras sente.
8 . O modo de Clarice Lispector ver a
criação literária guarda relação com o momento histórico em que ela escreve. Em
outros momentos históricos, outras relações ocorreram. Assinale a opção
correta.
(A) O
Modernismo relaciona-se com um modo de escrever que pretende discutir a criação
literária e produzir a simplicidade e a métrica do pastoralismo.
(B) O
Neoclassicismo relaciona-se com um modo de escrever que reproduz a arte barroca
tal como ela era.
(C) O
Realismo relaciona-se com um modo de escrever que se caracteriza pela
musicalidade, pela sinestesia e pelas aliterações.
(D) O
Simbolismo relaciona-se com um modo de escrever que apresenta a realidade tal
como ela é.
(E) O
Romantismo relaciona-se com um modo de escrever que adota a estética da expressão
do eu autoral.
9. Leia o texto:
Para
literatos e memorialistas do século XIX, um dos grandes desafios era, então,
construir uma nação tendo que levar em conta as antigas tradições, quase sempre
católicas e repletas de “atrasadas” manifestações populares e negras.
As
discussões sobre as perspectivas da nacionalidade brasileira ganharam novo
impulso nas últimas décadas do século
passado, após a abolição da escravidão, quando definitivamente teriam que ser
incorporados os libertos e descendentes de africanos ao mercado de trabalho
livre e à “nação brasileira”.
Festas,
músicas e danças despontariam, entre setores intelectuais, como um importante
campo de estudos para se avaliar e, principalmente, projetar a versão musical
da nação brasileira. Afinal, estas manifestações passaram a representar
valiosos indicativos de uma nação formada por uma “raça mestiça”, de inegável
influência portuguesa, católica e africana.
Escritores
e músicos de diferentes partes do Brasil, no fim do século XIX e início do XX,
iriam identificar e construir, a partir de variadas e híbridas doses de etnia e
cultura, uma original identidade nacional, musical e festiva.
Marta
Abreu. invenção de um país festivo. Caderno ideias, Jornal do Brasil.
Adaptação.
9. Assinale a opção que corresponde ao
fragmento “Escritores e músicos de diferentes partes do Brasil, no fim do
século XIX e início do XX, iriam identificar e construir, a partir de variadas
e híbridas doses de etnia e cultura, uma original identidade nacional, musical
e festiva.”
(A) Em
cada porta um frequentado olheiro, / Que a vida do vizinho, e da vizinha /
Pesquisa, escuta, espreita, e esquadrinha, / Para a levar à Praça, e ao
Terreiro. (Gregório de Matos)
(B)
Última flor do Lácio, inculta e bela, / Ès, a um tempo, esplendor e sepultura:
/ Ouro nativo, que na ganga impura ia bruta mina entre os cascalhos vela...
(Olavo Bilac)
(C)
Assim eu quereria meu último poema / Que fosse terno dizendo as coisas mais
simples e menos intencionais / Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas /
Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume (Manuel Bandeira)
(D)
Quem, Manha, despreza uma beleza, / A luz da razão precisa;! E se tem discurso,
pisa/A lei, que lhe ditou a Natureza. (Tomás Antônio Gonzaga)
(E)
Misturo tudo num saco, / Mas gaúcho maranhense / Que pára no Mato Grosso, /
Bate este angu de caroço (Mário de Andrade)
10. Assinale a passagem que exemplifica ser
a mestiçagem uma construção intelectual, mas que está presente no sentimento do
povo de forma ambígua.
(A)
Amálgama é miscigenação e mistura mas é muito mais do que isso: é a diversidade
em combinação permanente causando esta flutuação de constante capacidade de
adaptações e criatividade. (Jorge Mautner)
(B)
Qual a minha cor, não é? Para escrever aí no questionário. Deixa eu pensar.O
que o senhor acha que eu sou? Olhando para minha cara. Bem para minha cara. O
que eu sou? Assim, no espelho? Coloque ai, escreva: mestiça. Isso: doméstica
mestiça. Pode anotar. Só não vai contar para ninguém, tá? (Marcelino Freire)
(C) O
Estatuto da Igualdade Racial, que está para ser votado na Câmara em meio a
discussões acirradas, reserva cotas para afro-brasileiros, mas não menciona
caboclos, cafuzos, mamelucos ou mulatos. É uma ficção bicolor, dizem seus
críticos. É o reconhecimento de uma divisão social, retrucam seus defensores.
(Miguel Conde)
(D)
Mulatas e negras, empregadas nas casas ricas, amontoavam-se ante as malas
abertas: — Compra, freguesa, compra. É baratinho... —a pronúncia cômica, a voz
sedutora. Longas negociações. Os colares sobre os peitos negros, as pulseiras
nos braços mulatos, uma tentação’ (Jorge Amado)
(E)
Com a proibição do tráfico de escravos em 1850, e o aumento da imigração
européia na segunda metade do século XX, a cor dos comerciantes de rua do Rio
de Janeiro começou a ficar mais variada. Como mostra o retrato de Augusto Malta
e Marc Ferrez, se tornou mais frequente a presença de mestiços e brancos entre
os ambulantes. (O Globo, Logo)
Texto para as questões seguintes
A
questão racial parece um desafio do presente,
mas trata-se de algo que existe desde há muito tempo. Modifica-se ao acaso das situações, das
formas de sociabilidade e dos jogos das
forças sociais, mas reitera-se
continuamente, modificada, mas persistente.
Esse é o enigma com o qual se defrontam uns e outros, intolerantes e tolerantes, discriminados
e preconceituosos, segregados e
arrogantes, subordinados e dominantes,
em todo o mundo. Mais do que tudo isso,
a questão racial revela, de forma particularmente evidente, nuançada e estridente, como funciona
a fábrica da sociedade, compreendendo
identidade e alteridade, diversidade e
desigualdade, cooperação e
hierarquização, dominação e alienação.
Octavio
Ianni. Dialética das relações sociais.
Estudos avançados, n. 50, 2004.
11. Segundo o texto, a questão racial
configura-se como “enigma”, porque
a) é
presa de acirrados antagonismos sociais.
b) tem
origem no preconceito, que é de natureza
irracional.
c)
encobre os interesses de determinados estratos
sociais.
d)
parece ser herança histórica, mas surge na
contemporaneidade.
e)
muda sem cessar, sem que, por isso, seja superada.
12.
Conforme o texto, na questão racial, o
funcionamento da sociedade dá-se a ver de modo
a)
concentrado.
b)
invertido.
c)
fantasioso.
d)
compartimentado.
e)
latente.
Texto
para as próximas questões
Já na
segurança da calçada, e passando por um
trecho em obras que atravanca nossos passos, lanço à queima-roupa:
— Você
conhece alguma cidade mais feia do que
São Paulo?
—
Agora você me pegou, retruca, rindo. Hã, deixa
eu ver... Lembro-me de La Paz, a capital da Bolívia, que me pareceu bem feia. Dizem que Bogotá é muito
feiosa também, mas não a conheço. Bem,
São Paulo, no geral, é feia, mas as
pessoas têm uma disposição para o
trabalho aqui, uma vibração empreendedora, que dá uma feição muito particular à cidade. Acordar
cedo em São Paulo e ver as pessoas
saindo para trabalhar é algo que me
toca. Acho emocionante ver a garra dessa
gente.
R.
Moraes e R. Linsker. Estrangeiros em casa: uma
caminhada pela selva urbana de São Paulo. National Geographic Brasil. Adaptado.
13.
Os interlocutores do diálogo contido no texto compartilham o pressuposto de que
a)
cidades são geralmente feias, mas interessantes.
b) o
empreendedorismo faz de São Paulo uma bonita
cidade.
c) La
Paz é tão feia quanto São Paulo.
d) São
Paulo é uma cidade feia.
e) São
Paulo e Bogotá são as cidades mais feias do mundo.
14.
No terceiro parágrafo do texto, a expressão que indica, de modo mais evidente, o distanciamento
social do segundo interlocutor em relação às pessoas a que se refere é
a)
“disposição para o trabalho”.
b)
“vibração empreendedora”.
c)
“feição muito particular”.
d)
“saindo para trabalhar”.
e)
“dessa gente”.
15. Ao reproduzir um diálogo, o texto incorpora
marcas de oralidade, tanto de ordem
léxica, caso da palavra
“garra”, quanto de ordem gramatical, como,
por exemplo,
a)
“lanço à queima-roupa”.
b)
“Agora você me pegou”.
c)
“deixa eu ver”.
d)
“Bogotá é muito feiosa”.
e) “é
algo que me toca”.
Gabarito
Chegou e eu esperei ainda. Afinal, fui
levado à sua presença. Ao lado, em uma mesa mais baixa, lá estava o Capitão
Viveiros, o tal escrivão, muito solene, com a pena atrás da orelha, o seu olhar
cúpido e a sua papada farta. O delegado pareceu-me um medíocre bacharel, uma
vulgaridade com desejos de chegar a altas posições; no entanto, havia na sua
fisionomia uma assustadora irradiação de poder e de força. Talvez se sentisse tão
ungido da graça especial de mandar, que na rua, ao ver tanta gente mover-se
livremente, havia de considerar que o fazia porque ele deixava. Interrogou-me de
mau humor, impaciente, distraído, às sacudidelas. Repisava uma mesma pergunta;
repetia as minhas respostas.
BARRETO, Lima. Recordações do escrivão Isaías
Caminha. São Paulo: Ática, 1994. p. 63. (Série Bom Livro).
UESC
2010 - 1. Com base no fragmento inserido na obra, está correto o que se afirma
na alternativa
01) A mudança de condição de vida de
Isaías, quando passa de contínuo a repórter no jornal “O Globo”, provoca uma alteração
radical em seus conceitos sobre os outros e sobre si mesmo.
02) O escrivão Isaías Caminha considera os
literatos com os quais conviveu, quando trabalhou na
redação de um jornal, como modelos a imitar no seu fazer literário.
03) O narrador escreve as suas
“Recordações” com o intuito de alcançar a glória literária e, com ela, a
ascensão social.
04) O delegado representa a
autoridade que, movida pelo preconceito, exerce, de forma arbitrária, o poder.
05) O narrador-personagem, ao descrever o
delegado, revela-se imparcial.
[...] Considerei-me feliz no lugar de
contínuo da redação do O Globo. Tinha atravessado um grande braço de mar, agarrara-me
a um ilhéu e não tinha coragem de nadar de novo para a terra firme que barrava
o horizonte a algumas centenas de metros. Os mariscos bastavam-me e os insetos já
se me tinham feito grossa a pele...
De tal maneira é forte o poder de nos
iludirmos, que um ano depois cheguei a ter até orgulho da minha posição.
Senti-me muito ma i s q u e um c
o n t í n u o q u a l q u e r, me smo
ma i s q u e um contínuo de ministro. As conversas da
redação tinham-me dado a convicção de que o doutor Loberant era o homem mais
poderoso do Brasil; fazia e desfazia ministros, demitia diretores, julgava
juízes e o presidente. Logo ao amanhecer, lia o seu jornal, para saber se tal
ou qual ato seu tinha tido o placet desejado do doutor Ricardo.
BARRETO, Lima. Recordações do escrivão
Isaías Caminha. 3. ed. São Paulo: Ática, 1994. p. 99.
UESC
2011 - 2. O texto, articulado com a obra, permite considerar correta a alternativa
01) Isaías Caminha revela-se um ser humano
desprovido de qualquer vaidade.
02)
O n a r r a d o r u t i l i z a , n o
s e u r e l a t o , u m a
l i n g u a g e m essencialmente objetiva e precisa.
03) O narrador atribui tão somente aos
outros a não realização de seus projetos de vida.
04) O narrador reconhece, na narrativa, a atuação
da imprensa de seu tempo como marcada
pela ética e pelo compromisso com o social.
05) Isaías, através do relato de
sua trajetória de vida, mostra o ambiente social como discriminador de pessoas
pobres e de negros e mulatos.
3. Reconhecido há tempos, dentro e fora do
Brasil, como manifestação artística legítima e pública, o grafite vem sendo
visto também como um elemento relevante do espaço urbano, pois nele realiza
sucessivas intervenções.
3. Com base nessa
ideia e no foco da matéria jornalística, é correto afirmar que atualmente o
grafite
(A)
estimula e aprofunda o desemprego entre a população jovem urbana.
(B)
potencializa e provoca a revolta de grupos sociais oprimidos.
(C) renova e estetiza diversos trechos da paisagem urbana.
(D)
fortalece e antecipa o aspecto marginal das pichações.
(E)
abandona e contesta valores estéticos externos à cultura nacional.
4. Leia o texto:
TEXTO
VII
Senhora
Dona Bahia,
nobre
e opulenta cidade,
madrasta
dos naturais,
e dos
estrangeiros madre:
Dizei-me
por vida vossa
em que
fundais o ditame
de
exaltar os que aqui vêm,
e
abater os que aqui nascem?
Se o
fazeis pelo interesse
de que
os estranhos vos gabem,
isso
os paisanos fariam
com
conhecidas vantagens.
E
suposto que os louvores
em
boca própria não valem,
se tem
força esta sentença,
mor
força terá a verdade.
O
certo é, pátria minha,
que
fostes terra de alarves,
e inda
os ressábios vos duram
desse
tempo e dessa idade.
Haverá
duzentos anos,
nem
tantos podem contar-se,
que éreis
uma aldeia pobre
e hoje
sois rica cidade.
Então
vos pisavam índios,
e vos
habitavam cafres,
hoje
chispais fidalguias,
arrojando
personagens.
Gregório de Matos
Vocabulário
alarves
- que ou quem é rústico, abrutado, grosseiro,
ignorante; que ou o que é
tolo, parvo, estúpido.
ressábios
- sabor; gosto que se tem depois.
cafres - indivíduo de raça negra.
4. Todas as afirmativas sobre a construção
estética ou a produção textual do poema de Gregório de Matos
(Texto
VII) estão adequadas, EXCETO uma. Assinale-a.
(A)
Existem antíteses, características de textos no período barroco.
(B) Há
uma personificação, pois a Bahia, ser inanimado, é tratada como ser vivo.
(C) A ausência de métrica aproxima o poema do Modernismo.
(D) O
eu lírico usa o vocativo, transformando a Bahia em sua interlocutora.
(E) Há
diferença de tratamento para os habitantes locais e os estrangeiros.
5. Leia o texto:
Modinha do exílio
Os
moinhos têm palmeiras
Onde
canta o sabiá.
Não
são artes feiticeiras!
Por
toda parte onde eu vá,
Mar e
terras estrangeiras,
Posso
ver mesmo as palmeiras
Em que
ele cantando está.
Meu
sabiá das palmeiras
Canta
aqui melhor que lá.
Mas,
em terras estrangeiras,
E por
tristezas de cá,
Só à
noite e às sextas-feiras.
Nada
mais simples não há!
Canta
modas brasileiras.
Canta
– e que pena me dá!
Ribeiro Couto
5. Os versos dos poetas modernistas e
românticos apresentam relação de intertextualidade com o poema de Ribeiro
Couto, EXCETO em uma alternativa. Assinale-a.
(A) “Vou-me embora pra Pasárgada / Lá sou amigo do rei / Lá tenho a
mulher que eu quero / Na cama que escolherei” (Manuel Bandeira)
(B)
“Dá-me os sítios gentis onde eu brincava / Lá na quadra infantil; / Dá que eu
veja uma vez o céu da pátria, / O céu do meu Brasil!” (Casimiro de Abreu)
(C)
“Minha terra tem macieiras da Califórnia / onde cantam gaturamos de Veneza. /
Os poetas da minha terra / são pretos que vivem em torres de ametista,” (Murilo
Mendes)
(D)
“Ouro terra amor e rosas / Eu quero tudo de lá / Não permita Deus que eu morra
/ Sem que volte para lá” (Oswald de Andrade)
(E)
“Em cismar, sozinho, à noite, / Mais prazer eu encontro lá; / Minha terra tem
palmeiras, / Onde canta o Sabiá.” (Gonçalves Dias)
6. Pode-se afirmar sobre o poema de Ribeiro
Couto que
(A)
canta modas brasileiras só à noite e às sextas-feiras, porque as artes
feiticeiras são praticadas pelo eu lírico em seu exílio.
(B)
tem como objetivo expressar a depressão do eu lírico em terra estrangeira, mas
também capta os sentimentos do poeta durante o seu exílio.
(C) tem como referência original o tema e a métrica da “Canção do
exílio”, mas reelabora as referências românticas com a linguagem modernista.
(D)
tem a finalidade de descrever detalhadamente os moinhos com palmeiras onde
canta o sabiá, conforme pregava o Realismo.
(E)
expressa a simplicidade da linguagem do eu lírico, que prefere cantar modinhas
brasileiras no exílio a retornar ao Brasil.
Leia o texto:
Tudo o
que aqui escrevo é forjado no meu silêncio e na penumbra. Vejo pouco, ouço
quase nada.
Mergulho
enfim em mim até o nascedouro do espírito que me habita. Minha nascente é
obscura. Estou escrevendo porque não sei o que fazer de mim. Quer dizer: não
sei o que fazer com meu espírito. O corpo informa muito. Mas eu desconheço as
leis do espírito: ele vagueia. Meu pensamento, com a enunciação das palavras
mentalmente brotando, sem depois eu falar ou escrever — esse meu pensamento de
palavras é precedido por uma instantânea visão sem palavras, do pensamento —
palavra que se seguirá, quase imediatamente — diferença espacial de menos de um
milímetro. Antes de pensar, pois, eu já pensei.
Clarice
Lispector. Um sopro de vida.
7.
Assinale a opção que corresponde ao pensamento de Clarice Lispector
sobre a criação literária, no texto acima.
(A) A
obra em si mesma é tudo: se te agradar, fino leitor, pago-me da tarefa; se te
não agradar, pago-te com um piparote e adeus.
(B)
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
(C)
Vozes da infância, contai a história da vida boa que nunca veio.
(D) Pensar é a concretização, materialização do que se pré-pensou.
(E) O
poeta é um fingidor. Finge tão completamente que chega a fingir que é dor a dor
que deveras sente.
8 . O modo de Clarice Lispector ver a
criação literária guarda relação com o momento histórico em que ela escreve. Em
outros momentos históricos, outras relações ocorreram. Assinale a opção
correta.
(A) O
Modernismo relaciona-se com um modo de escrever que pretende discutir a criação
literária e produzir a simplicidade e a métrica do pastoralismo.
(B) O
Neoclassicismo relaciona-se com um modo de escrever que reproduz a arte barroca
tal como ela era.
(C) O
Realismo relaciona-se com um modo de escrever que se caracteriza pela
musicalidade, pela sinestesia e pelas aliterações.
(D) O
Simbolismo relaciona-se com um modo de escrever que apresenta a realidade tal
como ela é.
(E) O Romantismo relaciona-se com um modo de escrever que adota a
estética da expressão do eu autoral.
9. Leia o texto:
Para
literatos e memorialistas do século XIX, um dos grandes desafios era, então,
construir uma nação tendo que levar em conta as antigas tradições, quase sempre
católicas e repletas de “atrasadas” manifestações populares e negras.
As
discussões sobre as perspectivas da nacionalidade brasileira ganharam novo
impulso nas últimas décadas do século
passado, após a abolição da escravidão, quando definitivamente teriam que ser
incorporados os libertos e descendentes de africanos ao mercado de trabalho
livre e à “nação brasileira”.
Festas,
músicas e danças despontariam, entre setores intelectuais, como um importante
campo de estudos para se avaliar e, principalmente, projetar a versão musical
da nação brasileira. Afinal, estas manifestações passaram a representar
valiosos indicativos de uma nação formada por uma “raça mestiça”, de inegável
influência portuguesa, católica e africana.
Escritores
e músicos de diferentes partes do Brasil, no fim do século XIX e início do XX,
iriam identificar e construir, a partir de variadas e híbridas doses de etnia e
cultura, uma original identidade nacional, musical e festiva.
Marta
Abreu. invenção de um país festivo. Caderno ideias, Jornal do Brasil.
Adaptação.
9. Assinale a opção que corresponde ao
fragmento “Escritores e músicos de diferentes partes do Brasil, no fim do século
XIX e início do XX, iriam identificar e construir, a partir de variadas e
híbridas doses de etnia e cultura, uma original identidade nacional, musical e
festiva.”
(A) Em
cada porta um frequentado olheiro, / Que a vida do vizinho, e da vizinha / Pesquisa,
escuta, espreita, e esquadrinha, / Para a levar à Praça, e ao Terreiro.
(Gregório de Matos)
(B)
Última flor do Lácio, inculta e bela, / Ès, a um tempo, esplendor e sepultura:
/ Ouro nativo, que na ganga impura ia bruta mina entre os cascalhos vela...
(Olavo Bilac)
(C)
Assim eu quereria meu último poema / Que fosse terno dizendo as coisas mais
simples e menos intencionais / Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas /
Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume (Manuel Bandeira)
(D)
Quem, Manha, despreza uma beleza, / A luz da razão precisa;! E se tem discurso,
pisa/A lei, que lhe ditou a Natureza. (Tomás Antônio Gonzaga)
(E) Misturo tudo num saco, / Mas gaúcho maranhense / Que pára no
Mato Grosso, / Bate este angu de caroço (Mário de Andrade)
10. Assinale a passagem que exemplifica ser
a mestiçagem uma construção intelectual, mas que está presente no sentimento do
povo de forma ambígua.
(A)
Amálgama é miscigenação e mistura mas é muito mais do que isso: é a diversidade
em combinação permanente causando esta flutuação de constante capacidade de
adaptações e criatividade. (Jorge Mautner)
(B) Qual a minha cor, não é? Para escrever aí no questionário. Deixa
eu pensar.O que o senhor acha que eu sou? Olhando para minha cara. Bem para
minha cara. O que eu sou? Assim, no espelho? Coloque ai, escreva: mestiça.
Isso: doméstica mestiça. Pode anotar. Só não vai contar para ninguém, tá?
(Marcelino Freire)
(C) O
Estatuto da Igualdade Racial, que está para ser votado na Câmara em meio a
discussões acirradas, reserva cotas para afro-brasileiros, mas não menciona
caboclos, cafuzos, mamelucos ou mulatos. É uma ficção bicolor, dizem seus
críticos. É o reconhecimento de uma divisão social, retrucam seus defensores.
(Miguel Conde)
(D)
Mulatas e negras, empregadas nas casas ricas, amontoavam-se ante as malas
abertas: — Compra, freguesa, compra. É baratinho... —a pronúncia cômica, a voz
sedutora. Longas negociações. Os colares sobre os peitos negros, as pulseiras
nos braços mulatos, uma tentação’ (Jorge Amado)
(E)
Com a proibição do tráfico de escravos em 1850, e o aumento da imigração
européia na segunda metade do século XX, a cor dos comerciantes de rua do Rio
de Janeiro começou a ficar mais variada. Como mostra o retrato de Augusto Malta
e Marc Ferrez, se tornou mais frequente a presença de mestiços e brancos entre
os ambulantes. (O Globo, Logo)
Texto para as questões seguintes
A
questão racial parece um desafio do presente,
mas trata-se de algo que existe desde há muito tempo. Modifica-se ao acaso das situações, das
formas de sociabilidade e dos jogos das
forças sociais, mas reitera-se
continuamente, modificada, mas persistente.
Esse é o enigma com o qual se defrontam uns e outros, intolerantes e tolerantes, discriminados
e preconceituosos, segregados e arrogantes,
subordinados e dominantes, em todo o
mundo. Mais do que tudo isso, a questão
racial revela, de forma particularmente
evidente, nuançada e estridente, como funciona a fábrica da sociedade, compreendendo
identidade e alteridade, diversidade e
desigualdade, cooperação e
hierarquização, dominação e alienação.
Octavio
Ianni. Dialética das relações sociais.
Estudos avançados, n. 50, 2004.
11. Segundo o texto, a questão racial
configura-se como “enigma”, porque
a) é
presa de acirrados antagonismos sociais.
b) tem
origem no preconceito, que é de natureza
irracional.
c)
encobre os interesses de determinados estratos
sociais.
d)
parece ser herança histórica, mas surge na
contemporaneidade.
e) muda sem cessar, sem que, por isso, seja superada.
12.
Conforme o texto, na questão racial, o
funcionamento da sociedade dá-se a ver de modo
a) concentrado.
b)
invertido.
c)
fantasioso.
d)
compartimentado.
e)
latente.
Texto
para as próximas questões
Já na
segurança da calçada, e passando por um
trecho em obras que atravanca nossos passos, lanço à queima-roupa:
— Você
conhece alguma cidade mais feia do que
São Paulo?
—
Agora você me pegou, retruca, rindo. Hã, deixa
eu ver... Lembro-me de La Paz, a capital da Bolívia, que me pareceu bem feia. Dizem que Bogotá é muito
feiosa também, mas não a conheço. Bem,
São Paulo, no geral, é feia, mas as
pessoas têm uma disposição para o
trabalho aqui, uma vibração empreendedora, que dá uma feição muito particular à cidade. Acordar
cedo em São Paulo e ver as pessoas
saindo para trabalhar é algo que me
toca. Acho emocionante ver a garra dessa
gente.
R.
Moraes e R. Linsker. Estrangeiros em casa: uma
caminhada pela selva urbana de São Paulo. National Geographic Brasil. Adaptado.
13.
Os interlocutores do diálogo contido no texto compartilham o pressuposto de que
a)
cidades são geralmente feias, mas interessantes.
b) o
empreendedorismo faz de São Paulo uma bonita
cidade.
c) La
Paz é tão feia quanto São Paulo.
d) São Paulo é uma cidade feia.
e) São
Paulo e Bogotá são as cidades mais feias do mundo.
14.
No terceiro parágrafo do texto, a expressão que indica, de modo mais evidente, o
distanciamento social do segundo interlocutor em relação às pessoas a que se refere é
a)
“disposição para o trabalho”.
b)
“vibração empreendedora”.
c)
“feição muito particular”.
d)
“saindo para trabalhar”.
e) “dessa gente”.
15. Ao reproduzir um diálogo, o texto incorpora
marcas de oralidade, tanto de ordem
léxica, caso da palavra
“garra”, quanto de ordem gramatical, como,
por exemplo,
a)
“lanço à queima-roupa”.
b)
“Agora você me pegou”.
c) “deixa eu ver”.
d)
“Bogotá é muito feiosa”.
e) “é
algo que me toca”.