segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Memórias do Escrivão Isaías Caminha - Prof. Mara Rute Elabora questões para a UESC


 Primeiras Palavras...
Olá, esse é o nosso primeiro encontro do ano. Fico feliz que 2011 tenha acabado e espero que em 2012 seu sonho de chegar a universidade se realize. Estamos trabalhando muito para isso.
Faltam 06 dias para o vestibular do UESC e sei que para alguns é muito pouco tempo ... fica aquela sensação de que ainda falta estudar muita coisa... Relaxe e continue fazendo o que você pode, buscando ultrapassar um pouco os seus limites.
Fernando Pessoa disse: A minha parte é feita, o por fazer-se é só com Deus. Então faça a sua parte e deixe o resto com quem pode mudar destinos.
Tem sido uma honra compartilhar dessas preciosas horas com você!
Mara  Rute  Lima
A história
Esse livro pertence ao gênero romance. Único no processo da UESC. A trama é simples, trata-se de um jovem do interior que sonha em ser doutor (como forma de melhorar de vida e limpar-se da condição de  “azeitonado”) e para isso vai para o Rio de  Janeiro. Lá, presencia a dura  realidade de uma cidade preconceituosa e cruel. Peregrina durante muito tempo passando até necessidade. Consegue um emprego no jornal, mas sua melhoria de vida não se relaciona ao estudo e sim as relações  que  estabelece e a segredos que passa a guardar. Termina a história percebendo que a cidade lhe corrompeu e, sobretudo que os  valores vigentes não são os de  estudo e mérito.


1. A abertura do livro é feita por Isaias que se lembra da educação que recebeu na infância e já claramente estabelece uma distinção entre a relação com o pai – padre instruído e sua mãe, leiga. De que maneira se percebe no livro a influência do pai como maior que a mãe?

Isaias escolhe estudar e doutorar-se, inclusive como forma de livrar-se de sua condição racial – azeitonado. Aliado a isso, em suas memórias, lembra-se sempre a da superioridade do pai sobre a mãe que lhe aparecia triste e humilde diante da capacidade do pai de dizer os nomes das estrelas do céu e explicar a natureza da chuva.

Leia o trecho:
Passava por um largo descampado e olhei o céu. Pardas nuvens cinzentas galopavam, e, ao longe, uma pequena mancha mais escura parecia correr engastada nelas. A mancha aproximava-se e, pouco a pouco, via-a subdividir-se, multiplicar-se; por fim, um bando de patos negros passou por sobre a minha cabeça, bifurcado em dois ramos, divergentes de um pato que voava na frente, a formar um V. Era a inicial de “Vai”. Tomei isso como sinal animador, como bom augúrio do meu propósito audacioso. No domingo, de manhã, disse de um só jato à minha mãe:
— Amanhã, mamãe, vou para o Rio.
2.  Com base no trecho acima comente sobre a visão de Isaias, aliado a circunstância em que tal visão acontece e a realidade encontrada no Rio de Janeiro.
Ao concluir os estudos Isaias, com uma boa reputação de estudante, ainda esperou pelo menos dois anos para ir ao Rio de Janeiro. A maior parte do tempo vivia pela manhã decidido a ir a cidade grande e a tarde a pensar nas dificuldades da cidade com seus egoísmo e sua falta de protetores para vencer nela. Ao ler uma notícia no jornal sobre seu colega Felício que recebia o elogio pela formação em farmácia pensou que se seu amigo tão burro a quem deu aula de português tinha conseguido, porque ele não.  Pouco depois viu os pássaros no trecho acima e tomou isso com um sinal de que deveria partir.
Diferente de Felício não se formou no Rio, apenas transformou-se em jornalista, não por mérito, mas por depois de muito tempo trabalhando como auxiliar ter descoberto um segredo do chefe do jornal. E, antes da condição de trabalhar no Globo enfrentou a fome, o preconceito racial e  a solidão na grande cidade do Rio.


E seu tio Valentim – quase um pai, conseguiu para Isaias o que considerava elemento fundamental para a vida no Rio: uma carta do coronel Belmiro para o deputado Castro que ele ajudou a eleger. Na carta pedia para que o deputado providenciasse um trabalho para Isaias. Aqui o narrador deixa antever a sensação de poder do coronel. Porém, quando Isaias chega ao Rio Isaias percebe que a carta não tem validade alguma e que ele não é sequer bem recebido pelo deputado. Esse inclusive lhe manda voltar num dia em que sabe que não vai estar. Logo, as impressões primeiras sobre sua vida no Rio se desfazem e ele vivencia um Rio de Janeiro cruel e não acolhedor como esperava que fosse. O leitor também percebe um coronel que já não tem poder  na  sociedade do século XX.
Denúncia do voto de cabresto, da política do interior.

3. O livro aborda um tema constante na obra de Lima Barreto: o do preconceito racial. Assinale a alternativa que não contenha um trecho que permita antever isso:
a) “Ah! Seria doutor! Resgataria o pecado original do meu nascimento humilde, amaciaria o suplício premente, cruciante e onímodo de minha cor...”
b)” Doutor, como passou? Como está, doutor? Era sobre-humano!...”
c) “ Não tenho pejo em confessar  hoje que quando me ouvi tratado assim, as lágrimas me vieram aos olhos.”
d) “ Entretanto, isso tudo é uma  questão de semântica: amanhã, dentro de um século, não terá mais significação injuriosa.”
e) “ se me esforço em fazê-lo literário é para que possa ser lido, pois quero falar das minhas dores e dos meus sofrimentos ao espírito geral eno seu interesse, com a linguagem acessível a ele.


“O trem parara e eu abstinha-me de saltar. Uma vez, porém, o fiz; não sei mesmo em que estação. Tive fome e dirigi-me ao pequeno balcão onde havia café e bolos. Encontravam-se lá muitos passageiros. Servi-me e dei uma pequena nota a pagar. Como se demorassem em trazer-me o troco reclamei: "Oh! fez o caixeiro indignado e em tom desabrido. Que pressa tem você?! Aqui não se rouba, fique sabendo!" Ao mesmo tempo, a meu lado, um rapazola alourado reclamava o dele, que lhe foi prazenteiramente entregue. O contraste feriu-me, e com os olhares que os presentes me lançaram, mais cresceu a minha indignação. ... Mesmo de rosto, se bem que os meus traços não fossem extraordinariamente regulares, eu não era hediondo nem repugnante. Tinha-o perfeitamente oval, e a tez de cor pronunciadamente azeitonada”.
Trecho em que o autor deixa claro a questão racial.

4. Machado de Assis em suas obras e também em Papéis Avulsos ressalta a questão do título como importante na sociedade. Explique  como tal questão aparece nas  obras de Machado e de Lima Barreto respectivamente.
Em Memórias Póstumas Machado propõe  a ideia de Brás de tornar-se doutor para apenas aprender o esqueleto do código, deixando antever a busca do título  não pelo conhecimento, mas pelo reconhecimento social que esse porventura vem a oferecer. No conto Machadiano em Papéis Avulsos o pai chega a aconselhar o filho para que esse busque parecer, mais do que ser sábio. Não é diferente de Isaias Caminha: seu desejo de ser doutor revela seu anseio de ser esquecido pela condição racial e social. Afirma inclusive que a palavra doutor na sociedade era mágica (As pessoas, de fato, respeitavam). Quando se fez jornalista aprendeu a servir-se de outros jornais, a calcar seus artigos no que todo mundo dizia, não ter opinião divergente e assimilou de outros jornalistas o hábito de aprender ciências como Finanças e Economia Política lendo as notícias superficiais do jornal e citações de autores Célebres. Ao comportar-se assim age tal qual as recomendações do pai ao seu filho quando alcançou a maioridade em A Teoria do Medalhão.


“Escrevendo estas linhas, com que saudades me não recordo desse heróico anseio dos meus dezoito anos esmagados e pisados! Hoje... É noite.
Descanso a pena. No interior da casa, minha mulher acalenta meu filho único. A sua cantiga chega-me aos ouvidos cheia de um grande acento de resignação. Levanto-me, vou à varanda. A lua, no crescente, banha-me com meiguice, a mim e a minha humilde casa roceira. Por momentos deixo -me ficar sem pensamentos, envolto na fria luz da lua, e embalado pela ingênua cantilena de minha mulher. Correm alguns instantes; ela cessa de cantar e o brilho do luar é empanado por uma nuvem passageira. Volto às minhas reminiscências: vejo o bonde, a gente que o enchia, os sofrimentos que me agitavam, a rua transitada...
Os meus desejos de vingança fazem-me agora sorrir e não sei por que, do fundo da minha memória, com essas recordações todas, chega-me também a imagem de uma pesada carroça, com um grande lajedo suspenso por fortes correntes de ferro, vagarosamente arrastada sobre o calçamento de granito, por uma junta de bois enormes, que o carreteiro fazia andar com gritos e ferroadas desapiedadas...”
5. A partir do trecho acima e considerando a totalidade da obra comente sobre as características do narrador nessa obra.
Ao afirmar que seus sonhos de dezoitos anos estão esmagados e pisados o autor remete-se ao menino estudioso do interior que sonhava em fazer-se doutor no Rio de Janeiro. Em seguida ao utilizar o termo “ é Noite” revela ao leitor que não conseguiu, fruto de um comodismo como um auxiliar no jornal o Globo e um jornalista, não por mérito.


6. Quando Isaias vai procurar o deputado Castro na câmara o narrador revela a admiração que esse tem pelos legisladores em seguida mostra a grande decepção que terá depois da visita a que se deve sua decepção?

No seu imaginário Isaias pensava numa câmera de deputados associando-a aos grandes reis Assírios e aos filósofos Gregos. Sua decepção foi perceber que os legisladores da pátria eram sem organização e grandes causas.  Estranhou inclusive que em tal lugar de arquibancada grosseira e tanto barulho  se produzisse leis. Não foi diferente sua decepção com o deputado Castro - tinha uma carta do coronel pedindo emprego para ele. Não o encontrou na câmera, nem em casa, só na casa de sua amantes.

7. Assinale a alternativa que não contenha um trecho em que haja a presença da metalinguagem: 
a) “Penso — não sei por quê — que é este meu livro que me está fazendo mal... E quem sabe se excitar recordações de sofrimentos, avivar as imagens de que nasceram não é fazer com que, obscura e confusamente, me venham as sensações dolorosas já semimortas?”
b)  “Talvez mesmo seja angústia de escritor, porque vivo cheio de dúvidas, e hesito de dia para dia em continuar a escrevê-lo. Não é o seu valor literário que me preocupa; é a sua utilidade para o fim que almejo”
c)“ Se me esforço por fazê-lo literário é para que ele possa ser lido, pois quero falar das minhas dores e dos meus sofrimentos ao espírito geral e no seu interesse, com a linguagem acessível a ele.”
d) É este o meu propósito, o meu único propósito (...)Confesso que os leio, que os estudo, que procuro descobrir nos grandes romancistas o segredo de fazer. Mas, não é a ambição literária que me move o procurar esse dom misterioso para animar e fazer viver estas pálidas Recordações.
e) Com elas, queria modificar a opinião dos meus concidadãos, obrigá-los a pensar de outro modo; a não se encherem de hostilidade e má vontade quando encontrarem na vida um rapaz como eu e com os desejos que tinha há dez anos passados. Tento mostrar que são legítimos e, se não merecedores de apoio, pelo menos dignos de indiferença”.


Sobre ele mesmo e sua personalidade ele vai propondo ao  leitor:
“O caminho na vida parecia-me fechado completamente, por mãos mais fortes que as dos homens. Não eram eles que não me queriam deixar passar, era o meu sangue covarde, era a minha doçura, eram os defeitos de meu caráter que não sabiam abrir um. Eu mesmo amontoava obstáculos à minha carreira; não eram eles...
Não seria tolice, pusilanimidade escondida fazer repousar a minha felicidade na presteza com que um qualquer deputado atendesse um pedido de emprego? Era possível tê-los sempre à mão para os dar ao primeiro que aparecesse?
As condições de minha felicidade não deviam repousar senão em mim mesmo — conclui... Mas não era só isso que eu via. O que me fazia combalido, o que me desanimava eram as malhas de desdém, de escárnio, de condenação em que me sentia preso.”
8. A partir do trecho acima trace a personalidade de Isaias Caminha:
A personagem narradora associa a ideia de seu fracasso na vida ao elemento do destino, proposto com a ideia de que possuía um sangue covarde e um caráter defeituoso. Seu caráter fica bem visível quando aceita viver “a vidinha” no jornal em detrimento de sua ambição: estudar e virar doutor. Também reflete que o sonho de chegar no Rio e encontrar um emprego dado por um deputado e uma vida sem dificuldades parece, com os olhos do presente, um sonho tolo e que a sua felicidade ou a vida no Rio deveria provir dele mesmo. De seu esforço.

Um tema importante no livro, senão o mais importante é o tema do jornalismo. Como ele é produzido, a mediocridade que o cerca, o poder da mídia sobre a sociedade, a defesa de interesses pessoais. Segue em seguida algumas das importantes reflexões que o livro  faz a esse  respeito:
“Pagou sim, apressou-se em responder Plínio de Andrade; mas um dos empregados da livraria disse-lhe insolentemente: Você paga este sobre a Grécia, que queria levar agora e também o romance francês que levou anteontem... A Imprensa! Que quadrilha! Fiquem vocês sabendo que, se o Barba-Roxa ressuscitasse, agora com os nossos velozes cruzadores e formidáveis couraçados, só poderia dar plena expansão à sua atividade se se fizesse jornalista. Nada há tão parecido como o pirata antigo e o jornalista moderno: a mesma fraqueza de meios, servida por uma coragem de salteador; conhecimentos elementares do instrumento de que lançam mão e um olhar seguro, uma adivinhação, um faro para achar a presa e uma insensibilidade, uma ausência de senso moral a toda a prova... E assim dominam tudo, aterram, fazem que todas as manifestações de nossa vida coletiva dependam do assentimento e da sua aprovação... Todos nós temos que nos submeter a eles, adulá-los, chamá-los gênios, embora intimamente os sintamos ignorantes, parvos, imorais e bestas... Só se é geômetra com o seu placet, só se é calista com a sua confirmação e se o sol nasce é porque eles afirmam tal coisa... E como eles aproveitam esse poder que lhes dá a fatal estupidez das multidões! Fazem de imbecis gênios, de gênios imbecis; trabalham para a seleção das mediocridades, de modo que...”


—Oh! Caminha! Onde tens andado? Que tens, rapaz?
Era Gregoróvitch Rostóloff. Falei, contei-lhe a vida. Os seus olhos de conta mais se arredondaram de
desconfiança; mas, depois de duas ou três perguntas, de examinar-se o vestuário e algumas palavras de consolo, ao despedir-se, assim me convidou:
—Aparece-me logo, à noitinha, na redação do O Globo.
9. Qual a importância dessa cena  para a  vida de  Isaias  Caminha?

Isaias Caminha acreditou que sua chegada ao Rio fosse garantir-lhe uma vida melhor do que a que tinha no interior. No curto período, porém, ele não conseguiu o emprego que supostamente teria do deputado como garantia do coronel do interior que utilizou inclusive meios ilícitos para elegê-lo; a família enfrenta as doenças da mãe que impede de enviar mais ajuda financeira; é acusado de roubo no hotel por causa da sua cor e chega mesmo a passar fome. Quando recebe o convite do jornalista tem também a oportunidade de ser contínuo do jornal. E assim, condições de viver no Rio de Janeiro - não na vida que imaginava.

“De tal maneira é forte o poder de nos iludirmos, que um ano depois cheguei a ter até orgulho da minha posição. Senti-me muito mais que um continuo qualquer, mesmo mais que um continuo de ministro. As conversas da redação tinham-me dado a convicção de que o doutor Loberant era o homem mais poderoso do Brasil; fazia e desfazia ministros, demitia diretores, julgava juizes e o presidente, logo ao amanhecer, lia o seu jornal, para saber se tal ou qual ato seu tinha tido o placet desejado do doutor Ricardo. Participar de uma redação de jornal era algo extraordinário, superior, acima das forças comuns dos mortais; e eu tive a confirmação disso quando, certa vez, na casa de cômodos em que morava, dizendo-o ao encarregado que trabalhava na redação do O Globo, vi o pobre homem esbugalhar muito os olhos, olhar-me de alto a baixo, tomar-se de grande espanto como se estivesse diante de um ente extraordinário. As raparigas que residiam junto a mim, lavadeiras e costureiras, criadas de servir, apelidaram-me “o jornalista”, e mesmo quando vieram a ter exato conhecimento da minha real situação no jornal, continuei a ser por esse apelido conhecido, respeitado e debochado”.

Depois  revela  como eram as  relações  no jornal ...
“Quando se tratava de per si com qualquer dos empregados do jornal, ficava-se admirado que a folha se imprimisse e se escrevesse diariamente. Floc tinha em pouca conta Losque: um bufão, dizia ele; Bandeira desprezava Floc: um eunuco; e todos como que pareciam querer entredevorar-se até aos ossos. Entretanto, quando um fazia anos, a seção competente gemia e os adjetivos mais ternos e mais camaradários não eram poupados. De seção para seção, a guerra era terrível. A revisão dizia que a redação era analfabeta; a tipografia acusava ambas de incompetentes; e até a impressão que não lia nem via originais tinha uma opinião desfavorável sobre todas três.
A redação não perdoava a menor falha da revisão. Às vezes, eram os originais defeituosos; em outras, havia descuido ou a pretensão fazia emendar o que estava certo; mas sempre as reclamações choviam por parte dos redatores, dos colaboradores e dos repórteres.


O livro trata de uma questão interessante que permeava o contexto em que  foi produzida a obra:  a  reforma do Rio de Janeiro  para  não perder da  argentina -  tida  como européia.  Sem planejamento resolvemos  reformar o Rio e,  para ilustrar  essa ação meio louca ele  conta  do projeto  dos  sapatos  obrigatórios .

Questão
“ O motim não tem fisionomia, não tem forma, é improvisado. Propaga-se, espalha-se, mas não se liga. O grupo que opera aqui não tem ligação alguma com o que tiroteia acolá. São independentes; não há um chefe geral nem um plano estabelecido. Numa esquina, numa travessa, forma-se um grupo, seis, dez, vinte pessoas diferentes, de profissão, inteligência, e moralidade. Começa-se a discutir, ataca-se o Governo; passa o bonde e alguém lembra: vamos queimá-lo. Os outros não refletem, nada objetam e correm a incendiar o bonde.
No jornal exultava-se. As vitórias do povo tinham hinos de vitórias da pátria. Exagerava-se, mentia-se, para se exaltar a população. Em tal lugar, a polícia foi repelida; em tal outro, recusou-se a atirar sobre o povo. Eu não fui para casa, dormi pelos cantos da redação e assisti à tiragem do jornal: tinha aumentado cinco mil exemplares. Parecia que a multidão o procurava como estimulante para a sua atitude belicosa. O serviço normal da folha fazia-se com atividade. Os repórteres iam aos lugares perigosos, aos pontos mais castigados pela polícia, corriam a cidade em tílburis. Nem os revisores nem os seus suplentes faltavam à chamada; outro tanto sucedia com os tipógrafos e os outros operários.
Toda essa abnegação era para garantir os seus mesquinhos empregos. Um pobre tipógrafo, que morava para a Saúde, onde o transito se fazia com os maiores perigos, ficou todos os três dias no jornal. Temia ser morto por uma bala perdida. Houvera muitas mortes assim, mas os jornais não as noticiavam. Todos eles procuravam lisonjear a multidão, mantê-la naquelas refregas sangrentas, que lhes aumentava a venda. Não queriam abater a coragem do povo com a imagem aterradora da morte. A polícia atirava e não matava; os populares atiravam e não matavam. Parecia um torneio... Entretanto eu vi morrer quase em frente ao jornal um popular. Era de tarde. O pequeno italiano, na esquina, apregoava os jornais da tarde: Notícia! Tribuna! Despacho!”( Memórias do Escrivão Isaias Caminha)

Na canção O Salto o Rappa diz: “Aos jornais eu deixo meu sangue como capital e às famílias um sinal”
10. É possível estabelecer uma clara relação entre o trecho acima e a canção? Justifique.

O trecho propõe uma relação forte entre a violência – em partes comandada pelo próprio jornal, a venda (a mais) de 5 mil exemplares e o uso do jornal pelo povo como estimulante para seus atos de violência. Ao propor dessa forma, o autor estabelece uma relação capital – lucratividade - que o jornal (nesse caso O Globo onde trabalhava Isaias) tinha com aquele motim no Rio de Janeiro. A reflexão que a canção O Salto faz de que os jornais receberiam o sangue (representação de morte) como capital cumpre o mesmo sentido.


A  construção de  um herói
O homem que acaba de morrer não era um homem vulgar. No domínio de sua difícil arte, era uma notabilidade respeitada. Para nós, era muito mais: era um amigo, um dedicado e leal amigo a quem muito devíamos e prezávamos. Todos os que mourejam nesta tenda de trabalho, certamente não hão de esquecê-lo e não há nenhum que não tenha recebido um favor, uma alegria, uma satisfação de suas mãos.
O público que nos lê, não sabe o quanto esta vida de jornalista é esgotante e ingrata; não sabe que soma de energia ela exige e como nos tira os melhores momentos de ócio e os melhores minutos de prazer. Vivemos por assim dizer para os outros; e quem vive para os outros, é claro que muito pouco pode viver para si.
Charles de Foustangel atravessava a nossa vida como um anjo protetor; dele, tirávamos alguns raros instantes de alegria no meio das agruras que nos cercam. Era de ver como ele sabia desenvolver um menu, como imaginava um ‘quitute’ inédito, um prato saboroso, que verve especial punha nos nomes com que os batizava e que raros gozos eles traziam aos nossos paladares fatigados por esses hotéis detestáveis que nos impingem solas duríssimas por bifes de grelha. Quantas ocasiões não fomos nós de mau humor para a mesa de jantar, enervados, sem vontade de trabalhar, com a encomenda do artigo, da reportagem, da crônica para o dia seguinte e sem coragem para fazê-los, e nos levantávamos, graças à brandura do seu tempero e a eurritmia dos seus molhos, satisfeitos, solertes, cheios de novas energias!
......
Todos os jornais se referiram ao inditoso Charles de Foustangel e alguns abriram subscrições para socorrer a família do cozinheiro. Fora do convívio jornalístico, as manifestações de pesar não foram menores: o Centro dos Estudantes passou um telegrama de pêsames ao presidente da República Francesa e ao cortejo do enterro concorreram mais de cinqüenta carros, levando perto de uma centena de pessoas, entre as quais altas patentes do Exército e Marinha, diretores de repartições, homens da bolsa, literatos aclamados, revolucionários temidos e um capitão do Estado Maior, representando o presidente da República.
..............................
Seguiam-se-lhe as caleças, as vitórias e coupés, transportando a alta administração, civil e militar, as finanças, as letras e a revolução profissional, em tocante homenagem ao grande homem que era o cozinheiro do doutor Ricardo Loberant, diretor-proprietário d'O Globo.
Questão
11. Qual é o juízo crítico que se pode estabelecer do texto acima?
O trecho, mas, sobretudo, o livro passa a limpo o cotidiano num jornal fazendo reflexões sobre a produção da notícia, o poder da mídia e as construções alienantes que essa propõe. Essa é tida como um quarto poder que subjuga políticos e homens importantes a um jornalista. A trecho em destaque possui uma crítica sutil à construção de um herói póstumo. O tal homem não passava de um cozinheiro do diretor do jornal que assume notoriedade post-mortem depois de uma nota no Jornal O Globo que leva a produção em cadeia de condolências ao cozinheiro – visto agora como herói. Não é incomum casos de construções de noticias em cadeia como o Caso Bruno, Menino Hélio ou outros que a mídia explora e demoniza ou exalta.

Adelermo, antes que tomássemos qualquer providência, entrou. Correu ao telefone para avisar o diretor. O doutor Loberant não estava; tinha saído às dez horas para o jornal. A polícia fora avisada e era preciso que ele o fosse também. Onde estaria? Veio o Rolim. Adelermo e ele cochicharam. O redator de plantão chamou-me.
— Caminha! Tu vais aí a um lagar e do que vires não dirás nunca nada a ninguém. Juras?
— Juro.
— Vais à casa da Rosalina, procurar o doutor Loberant... É preciso discrição, hein? O Rolim não pode ir, tem que ficar aqui, para o que der e vier... Vai! Mas não fales nada, nunca!
— Entra, custe o que custar, recomendou-me Adelermo ao sair, e deu-me dinheiro.
12. Qual a importância disso para a vida de Isaias?  Justifique

Ao encontrar o diretor do Jornal em plena Orgia na casa de Rosalinda e deixando-o em situação vexatória ganhou do diretor uma atenção maior. Esse começou a lhe fazer perguntas de boa amizade.
 O diretor achava extraordinário a formação familiar e educação de Isaias deixando claro para o jovem do interior que os homens e mulheres do Brasil são quase sempre iletrados e os primeiros tornam-se malandros, planistas e as mulheres, fêmeas. Depois de ser elevado a condição de Jornalista, bater em um dos seus colegas e jantar com o diretor Isaias, por causa da intimidade com Loberant, passou a ser respeitado no jornal.

O final...
Chegamos afinal a uma casa. Lembrei-me da minha casa paterna. Era o mesmo aspecto, baixa, caiada, uma parte de tijolos, outra de pau-a-pique; em redor, uma plantação de aipins e batata-doce. Deram-nos água, ofereceram-nos café e continuamos para o Galeão que estava próximo. Quando chegamos à praia, o dia tinha agonizado de todo. Fomos a uma venda, pedimos algumas latas de sardinha, pão e vinho. Fomos servidos em velhos pratos azuis com uns desenhos chineses e as facas tinham ainda aquele cabo de chifre de outros tempos. À vista deles, dos pratos velhos e daquelas facas, lembrei-me muito da minha casa, e da minha infância. Que tinha eu feito? Que emprego dera à minha inteligência e à minha atividade? Essas perguntas angustiavam-me.
Voltamos de bote para a ponta do Caju. Durante a viagem a angústia avolumou-se-me. As pás dos remos, caindo nas águas escuras, abriam largos sulcos luminosos de minúsculas estrelas agrupadas e todo o barco vogava envolvido naquele estrelejamento, deixando uma larga esteira fosforescente.
Lembrava-me da vida de minha mãe, da sua miséria, da sua pobreza, naquela casa tosca; e parecia-me também condenado a acabar assim e todos nós condenados a nunca a ultrapassar.
A italiana conversava com o remeiro sobre a pesca. Ela conhecia a vida e fazia perguntas nítidas
Saltamos do bonde, no Campo de Sant'Ana, eu e Leda tomamos um carro; o diretor continuou para o jornal.
Em vão ela me fazia falar. Respondia-lhe por comprazer. Lembrava-me... Lembrava-me de que deixara toda a minha vida ao acaso e que a não pusera ao estudo e ao trabalho com a forca de que era capaz. Sentia-me repelente, repelente de fraqueza, de falta de decisão e mais amolecido agora com o álcool e com os prazeres... Sentia-me parasita, adulando o diretor para obter dinheiro.
Às minhas aspirações, àquele forte sonhar da minha meninice eu não tinha dado as satisfações devidas.
A má vontade geral, a excomunhão dos outros tinham-me amedrontado, atemorizado, feito adormecer em mim com seu cortejo de grandeza e de força. Rebaixara-me, tendo medo de fantasmas e não obedecera ao seu império.
O carro atravessara o Largo da Lapa e o seu caminho foi interrompido por uma aglomeração de populares.
Da caleça, pude ver o que havia. Era uma mulher das muitas que povoam o largo e proximidades, que ia entre dois soldados. Recordei-me que já tinha visto aquela fisionomia. Esforcei-me por lembrar. A minha vida começou a desfilar e quando cheguei à casa da italiana, lembrei-me que era a amante do Deputado Castro.
Perguntei então a mim mesmo por que não casara aquela rapariga, por que não vivera dentro dos costumes tidos por bons. Não achei resposta, mas julguei-me, não sei por quê, um pouco culpado pela sua desgraça.
O carro chegou e eu saltei para ajudar Leda a apoiar-se. Paguei ao cocheiro e, na calçada, e a perguntou-me:
— Não entras?
— Não, obrigado.
Insistiu várias vezes, mas recusei. Vim vagamente a pé até ao Largo da Carioca, sem seguir um pensamento.
Vinha triste e com a inteligência funcionando para todos os fados. Sentia-me sempre desgostoso por não ter tirado de mim nada de grande, de forte e ter consentido em ser um vulgar assecla e apaniguado de um outro qualquer. Tinha outros desgostos, mas esse era o principal. Por que o tinha sido? Um pouco devido aos outros e um pouco devido a mim. Encontrei Loberant:
— Então? perguntou maliciosamente.
— Deixei-a em casa.
— Pois se eu me tinha separado de vocês de propósito... Tolo! amos tomar cerveja...
Antes de entrar, olhei ainda o céu muito negro, muito estrelado, esquecido de que a nossa humanidade já não sabe ler nos astros os destinos e os acontecimentos. As cogitações não me passaram... Loberant, sorrindo e olhando-mecom complacência, ainda repetiu:
— Tolo!
Todos os Santos, Rio de Janeiro — 1908




Questões UESC e Questões de Interpretação
Chegou e eu esperei ainda. Afinal, fui levado à sua presença. Ao lado, em uma mesa mais baixa, lá estava o Capitão Viveiros, o tal escrivão, muito solene, com a pena atrás da orelha, o seu olhar cúpido e a sua papada farta. O delegado pareceu-me um medíocre bacharel, uma vulgaridade com desejos de chegar a altas posições; no entanto, havia na sua fisionomia uma assustadora irradiação de poder e de força. Talvez se sentisse tão ungido da graça especial de mandar, que na rua, ao ver tanta gente mover-se livremente, havia de considerar que o fazia porque ele deixava. Interrogou-me de mau humor, impaciente, distraído, às sacudidelas. Repisava uma mesma pergunta; repetia as minhas respostas.
BARRETO, Lima. Recordações do escrivão Isaías Caminha. São Paulo: Ática, 1994. p. 63. (Série Bom Livro).

UESC 2010 - 1. Com base no fragmento inserido na obra, está correto o que se afirma na alternativa
01) A mudança de condição de vida de Isaías, quando passa de contínuo a repórter no jornal “O Globo”, provoca uma alteração radical em seus conceitos sobre os outros e sobre si mesmo.
02) O escrivão Isaías Caminha considera os literatos com os quais conviveu,  quando  trabalhou na  redação de um jornal, como modelos a imitar no seu fazer literário.
03) O narrador escreve as suas “Recordações” com o intuito de alcançar a glória literária e, com ela, a ascensão social.
04) O delegado representa a autoridade que, movida pelo preconceito, exerce, de forma arbitrária, o poder.
05) O narrador-personagem, ao descrever o delegado, revela-se imparcial.

[...] Considerei-me feliz no lugar de contínuo da redação do O Globo. Tinha atravessado um grande braço de mar, agarrara-me a um ilhéu e não tinha coragem de nadar de novo para a terra firme que barrava o horizonte a algumas centenas de metros. Os mariscos bastavam-me e os insetos já se me tinham feito grossa a pele...
De tal maneira é forte o poder de nos iludirmos, que um ano depois cheguei a ter até orgulho da minha posição. Senti-me muito ma i s   q u e   um  c o n t í n u o   q u a l q u e r,  me smo  ma i s   q u e   um contínuo de ministro. As conversas da redação tinham-me dado a convicção de que o doutor Loberant era o homem mais poderoso do Brasil; fazia e desfazia ministros, demitia diretores, julgava juízes e o presidente. Logo ao amanhecer, lia o seu jornal, para saber se tal ou qual ato seu tinha tido o placet desejado do doutor Ricardo.
BARRETO, Lima. Recordações do escrivão Isaías Caminha. 3. ed. São Paulo: Ática, 1994. p. 99.

UESC 2011 - 2. O texto, articulado com a obra, permite considerar correta a alternativa
01) Isaías Caminha revela-se um ser humano desprovido de qualquer vaidade.
02)  O   n a r r a d o r   u t i l i z a ,   n o   s e u   r e l a t o ,   u m a   l i n g u a g e m essencialmente objetiva e precisa.
03) O narrador atribui tão somente aos outros a não realização de seus projetos de vida.
04) O narrador reconhece, na narrativa, a atuação da imprensa  de seu tempo como marcada pela ética e pelo compromisso com o social.
05) Isaías, através do relato de sua trajetória de vida, mostra o ambiente social como discriminador de pessoas pobres e de negros e mulatos.

O Conto em 25 baianos - Questões da UESC 2012 por Mara Rute Lima


Primeiras Palavras:
Esse livro nunca caiu no processo seletivo desde sua indicação e são 25 histórias diferentes que em conjunto fazem um excelente perfil da literatura baiana de contistas. Muito bom.
Mas, como a leitura não é por prazer, mas para a apreensão de dados, informações e entendimentos para uma prova e, mais uma prova que está próxima resolvi já transformar as histórias em possíveis questões. Facilitará muito para vocês.
Quando aprovados leiam o livro tem histórias fenomenais. A minha predileta? A Academia dos Trinta.
Eu tive o prazer de trabalhar com Cyro de Mattos o organizador do livro. Chic não. Tenho até o livro autografado.
Mara Rute Lima




A abertura do livro é o parecer feito por Cyro de Mattos, autor de um dos contos e organizador desta seleção. Segundo ele, o conto é uma modalidade textual de difícil definição por ser uma modalidade que se funde, algumas vezes, com outras manifestações artísticas. Afirma também que o conto provém de tempos primitivos.

A moça dos pães de queijo

É uma história de amor que se passa em Salvador, nela, o autor apresenta o Largo da Palma (local dos acontecimentos) fazendo uso de uma figura de linguagem denominada de personificação dando vida ao Largo e também a cidade de Salvador.  (...) o largo da Palma parecia agasalhar-se para dormir”.”; “ Ninguém dirá, vendo assim o Largo  da Palma a cochilar, que nele houve enorme agitação durante o dia.”; “ Salvador,pois, suava por todos os lados.”
Após apresentar o largo, Adonias convida o leitor a conhecer a casa dos pãezinhos de queijo explicando logo que “a casa é casa porque a tabuleta, em tinta azul” o diz por que se trata na verdade de uma lojinha e, mais importante que os pãezinhos é a delicadeza de quem os vende: Célia.  Com sua voz a moça encantou Gustavo, jovem mudo que foi atender ao pedido da avó para comprar os pãezinhos. Depois de ouvir “tenha cuidado para não amassar os pãezinhos de queijo” da tal voz tomada por alguns como “o som mais bonito que o canto de um pássaro” correu para casa e “a voz permanecera e de tal moda estava ali que receava até aqui a avó pudesse escutá-la.”
Então entre idas e vindas Gustavo começa a namorar a Célia que sabe que ele é mudo, mas  nutre por ele um grande sentimento. Se encontram sempre no largo da Palma que presenciou o milagre.

Possíveis Questões

1. Comente sobre os traços de Gustavo, a relação dele com sua família (igual ou diferente de Célia) e como era a relação dele com a moça dos pãezinhos de queijo.
 O conto deixa claro que tanto Célia quanto Gustavo não tinham uma relação de comunicação eficaz com a família. Célia não conta para a mãe seus sentimentos pelo rapaz e vive no seu quarto com suas dúvidas e Gustavo não é muito aceito pelo pai e afastou-se da mãe muito cedo por uma possível loucura d aparte desta. Apesar desses abismos nas relações familiares Adonias  produz um laço  entre os dois de tal forma que nem parecem recém-namorados. Isso se vê desde a padaria quando Célia percebe o interesse do rapaz até quando ela consegue se comunicar sem uso de  papéis.
Após um pedido de Gustavo Célia faz pãezinhos de queijo para ele. Eis o trecho:
“ A massa, o queijo, o sal, o fogo. E veio fazendo os pãezinhos de queijo, um a um, tendo-os nas mãos como se fosse comê-los (...) Sentiu o coração alegre enquanto durou o trabalho e foi essa alegria do coração que a fez inventar um canção que cantou, baixinho, para si mesma. É preciso querer e querer muito para alcançar.”
....
“ – Quando fiz, Gustavo,pensei colocar nele o meu próprio sangue.
Ele come lentamente, muito lentamente, como se estivesse  a comer uma fruta. E mal termina, ela fecha-lhe a boca com a sua própria boca.”
2.  Essas cenas levarão a um desfecho da história a que se poderia aplicar o conceito de milagre do amor? Justifique.
 A narrativa de Adonias conta de todos os esforços que a família de Gustavo fez para que ele falasse, inclusive que ele  foi desenganado por vários médicos. Logo, falar depois de comer os pãezinhos feitos com o amor da  namorada pode ser sim entendido  como um milagre. Depois do acontecimento a história se encerra sem que o autor sugira qualquer explicação além da vontade da namorada que o seu amado voltasse a falar.

O SORRISO DA ESTRELA
Pedro passa a entender a visão particular de Estela quando ela morre aos 13 anos. Durante a infância, rejeita os abraços, as brincadeiras de Estela, e não aceitava ter uma irmã “louca”, que na verdade entendemos com a visão diferente do mundo. A menina também era debochada pelos amigos dele.
Porém, mesmo com todas as ignorâncias de Pedro, o qual apelidava de Dindinho, Estela nunca desistia de conquistar o irmão seja dando de presentes estrelas ou  até o direito de escolha da cor de suas asas no céu. O desfecho da história é Pedro dirigindo-se a Estela:
Minha irmã. Ainda hoje eu contemplo a tua estrela e tenho uma vontade enorme de que fosse minha. Eu vejo tua imagem se projetando de lá, num sorriso longe que não me deixa desamparado. Era essa luz que você me ofereceu, por apenas  um sorriso que já era  seu sem que eu soubesse. Quantas estrelas do céu – e eu não possuo uma sequer.
 O texto nos permite a reflexão de que existem pessoas diferentes como Estela, mas que todos apesar das diferenças devem ser tratados iguais. Sendo esta aprendizagem que ele absorve com a morte de sua irmã. Além disso, ele aceita o apelido de Dindinho, acrescentando que não é uma referência semântica a palavra doido.
Possíveis Questões
O autor Aleiton Fonseca logo na abertura de seu conto afirma:
“Estela estava morta, aos treze anos. E eu sentia dentro de mim esta morte. Era um pouco também eu morto, sem tempo de me redimir e poder amar minha irmã, como – só agora!”
3. Ao utilizar a palavra redimir o autor sugere ter cometido um erro na forma como se relacionava com sua irmã. Comente sobre isso levando em consideração todo o conto.
O narrador, constrói um conto memorialista para nos apresentar seus momentos de existência ao lado da irmã – uma menina especial, que conversava com pedras , que perguntava  ao irmão qual seria a  cor de suas asas no céu  e que vivia num mundo  de imagens. Ele afirma que o trabalho do tempo fez com que as falas e o comportamento de Estela amaciasse seu coração duro, o que faz com que ele agora  tenha  uma nova visão da irmã. Visão que evoca  saudades, lágrimas e  remorso por  não ter  uma estrela - presente oferecido pela irmã caso ele sorrisse para ela  todos os  dias.

“O tempo me deu estes cabelos brancos, mas a minha memória guarda os sinais do semblante de Estela, com suas alegrias sem nenhum motivo. Em nosso quintal, as pedras, os tocos de pau, as folhagens ao vento puxam conversa comigo, mas eu continuo mudo. No entanto, agora sinto: Eu sou Dindinho.
4. Explique, com base no conto, os trechos em negritos ressaltados no trecho acima.
A passagem do tempo permite que Pedro veja a irmã com um novo olhar. Agora entende perfeitamente  que seus modos era de alguém que tinha para si um mundo de imagens, um mundo singular. Entender a irmã não significa  porém ser  igual a ela.  Por isso ele pode aceitar que ela fale com pedras, mas ele não tem condições de  falar, é mudo. Também, ao afirmar que é Dindinho aceita ser como a irmã o designou.

DEZ ANOS DEPOIS
                Fazia dez anos que o Coronel Otaviano Cerqueira morrera, vítima de um infarto quando comemorava seu sexagésimo quarto aniversário num jantar em família em seu luxuoso apartamento com arroz à grega e camarão dorê.  Participavam apenas sua mulher, D. Marilena, a filha casada, Zilda, e o genro, José Paulo de Andrada.  A questão da história começa quando ele dá a terceira garfada de seu prato predileto, preparado por Teodora, a velha cozinheira da família, e morre, em pleno jantar.
                Para o espanto de todos D. Marilena não soltou um grito, deixou se ficar imóvel, enquanto a filha, o genro e a empregada precipitavam se em pânico. Como se nada acontecera continuou seu jantar e depois exigiu sua sobremesa, pudim de leite condensado e um cafezinho. Mais espantoso ainda foi o fato de D. Marilena não comparecer ao velório, ao enterro, ou não derramar, em momento algum, qualquer lágrima. Todos não entendiam o que estava acontecendo....O comportamento de D. Marilena é explicado pela certeza de sua loucura uma vez que não se tratava mais de indiferença, ocorria também a ressurreição do marido, ela agia como se o marido ainda estivesse em casa, mas não houve a necessidade de interná-la porque ela continuava a ser exatamente como era...gostava de ler romances que não dessem trabalho pra ler, opinava na cozinha sem entender nada de culinária gostava de ir ao Shopping.... E que ninguém tentasse dizer-lhe que o coronel morrera, porque era o mesmo que falar com uma parede.
                No aniversário do Coronel, todos os anos, o jantarzinho íntimo se repetia igualmente quando ele era vivo.
                Aquele era o décimo jantar apor a morte do Coronel. Zilda já tão acostumada com a loucura da mãe quis saber o que o pai estava achando do seu jantar de aniversário. D. Marilena se espanta e indaga a filha perguntando que bobagem era o que ela estava dizendo e reforçando que o marido já havia morrido há dez anos e naquela mesma mesa.
                D. Marilena se levanta e caminha para o quarto onde se deita. Neste momento, sua filha e seu genro ao conferi-la na cama, percebem que ela já não estava mais neste mundo, agora sim, devia estar ao lado do seu marido Coronel, e para sempre!
Possíveis Questões

 “– Zilda, que bobagem é esta? O seu pai está morto há dez anos... Foi aqui mesmo, nesta mesa, não se lembra?
E, sem esperar resposta, ergueu-se, sem sequer lançar-lhes um olhar, retirou-se  da sala em direção ao seu quarto, deixando a filha e o genro perplexos e emudecidos. Como não voltou de lá de dentro, foram, os dois, atrás dela”.
5. Porque a resposta de D. Marilena deixou a filha e o genro perplexos?
Na narrativa, após a morte do marido, no jantar do aniversário deste, a esposa agiu como se nada tivesse ocorrido. Assim, mandava preparar sua comida predileta, comemorava anualmente seu aniversário e conversava, para o espanto dos empregados e  da família, com o esposo. Tendo se passado dez anos, a filha, já  acostumada ao comportamento da mãe pergunta o que seu pai está achando do jantar de  aniversário. Tal pergunta desencadeou em D. Marilena uma resposta inesperada já que ela demonstra ter consciência  da morte  do marido.

ROSA TEM FEBRE DEMAIS
O conto, em primeira pessoa, logo na abertura propõe que é produzido com elementos fantásticos: Espero a madrugada e visto minha  roupa de  sonho... aproveitando as manchas de escuridão, sombras que  grandes árvores projetam.
Ao caminhar à noite, na cidade, o narrador diz encontrar-se com pessoas que costumam sair à noite e elas se surpreendem em vê-lo com “roupa de sonho” que seria as barbas brancas, o manto vermelho e as botas negras.
O texto revela que ele tem poderes sobre as águas. Peixes, pássaros ...  como também envia luz para  casa das pessoas  por onde passa. Encontra-se com crianças e com elas fala de sua intimidade com as coisas do céu e do mar. Diz ser amigo de Deus e que um dia Deus faria o que ele mandasse. As crianças afirmam tê-lo esperado e ele se dirige a elas perguntando o que elas queriam. Ao contrário do que seria o desejo de uma criança – brinquedo, dinheiro, caminhar no céu... Elas  desejam que ele  conte histórias e cantigas de ninar  principalmente  para Rosa que  tem febre demais.
Há claramente no texto duas circunstâncias, uma real e outra imaginária. Isso fica bem perceptível no caso da descrição da morte de  Rosa (pg.53). No imaginário  as estrelas, peixes e  lebres lhe seguem até encontrar Rosa, a menina que tem febre. Na realidade apenas  as  crianças o acompanham. Ele encontra  um carro, encaminha para o  hospital e o médico  cuida de Rosa, que ficará  curada  da febre.
“Vejo Rosa, está deitada e em torno os outros garotos, em silêncio, estão parados a olhar. A febre queima e eu peço, mas os ventos não me vêm ajudar. O mar continua quieto, os anjos para longe fugiram, os pássaros e as cobras, fugiram também os pardais. De Rosa a vida foge, eu imploro a Deus que venha depressa, venha a Rosa ajudar. Ninguém ouve ninguém atende, os meninos me olham – Têm medo -, a febre de Rosa é demais. É noite e não conto histórias, não prometo navios de incenso e mirra, flores e âmbar. Carrego Rosa nos braços, a vida não deve parar. Corro e arfo, gosto de sangue na boca, subo a ladeira de pedras e os garotos atrás. Um carro logo aprecem no largo outro lhe vem atrás., Rosa carrego e corremos sobre rodas, eu e Rosa os garotos atrás. Agora a manhã vem chegando, no Hospital eu espero, a gente do dia passa e olha minha fantasia de sonho. Os meninos em torno me escutam e eu repito “ Rosa tem febre demais”. O doutor vem e e me levanto:
- Doutor, e Rosa?
- Já não tem mais febre. Sim, ficará boa.
Ao chegar em casa  sua mulher  guarda a roupa de sonho (sugestão de Papai Noel?) e recomenda que ele  durma antes de  ir trabalhar.
Possíveis Questões

“ Chamo os ventos e mando que a ergam, chamo o mar e mando que limpe aquele lugar, chamo os pássaros, chamo as flores e chamo os anjos a cantar. Os ventos a embalam, os pássaros tecem uma rede, uma rede de penas e luar – e Rosa nela se deita, a vida toda refeita sorrindo para a morte que morre a estertorar.”
6. É correto afirmar a presença do onírico no texto acima?
Há no texto uma descrição das ações reais: um homem se veste de papai Noel e consegue levar para o hospital uma criança que agonizava de febre na noite de natal. Há também elementos de sonho como a  capacidade desse homem de  levar luz, de  ser  acompanhado por estrelas, lebres e poder ensinar  o caminho do céu. Além disso, já na abertura, a própria personagem avisa vestir-se  de  “roupa de  sonho”.

CORONEL, CACAUEIRO E TRAVESSIA
O conto de Cyro de Mattos já começa com uma pergunta existencial: pra que se viver em fim de vida? Mas além dessa temática as linhas escritas por esse grapiúna são sobre um coronel, um pé de cacau – herança última dos tempos áureos e sobre a mentalidade da nova geração. Trata-se de um conto retrato de uns tempos e umas gentes. Universalizado tal qual Guimarães em seus sertões.
Além da história recortada e não-linear o texto inova por apresentar formatos diferentes para a construção do texto e inserir, inclusive, imagens poéticas. Dialogado com outra tecedura textual produzida pelo Cyro de Mattos: a poesia.
A abertura sem apresentação de personagens, mas com uma singular forma de pensamento nos revela o que pensa o coronel:
Segundo ele viver em fim de vida é dor e tormento e o tempo de agora é duro, duro de se roer e seu olhar para o passado  só mostra que o cacaueiro não é uma arvore boa, mas um castigo terrível, fora mel, dentro fel, qualquer coisa de enfeitiçada com seus caminhos de usuras e ciladas do demo.
Também o coronel reflete sobre o clima – contribuinte das desgraças - seca escasseando as safras ou águas, alagando todo o terreno. E depois ainda diz que o Governo durante todo o ano vive a sugar o sangue alheio.
Depois dos pensamentos do coronel vamos num dia de sol quente à sua casa de mesa e Jacarandá e cadeiras vazias e para um jardim em que o cacaueiro sentinela do mundo, mesmo adubado por mãos experientes, não dá mais fruto.
E depois se ouve e tiros e o coronel a excomungar a família. Em seguida presta-se ao serviço de mais reflexões:
Felizes são aqueles que descobrem logo cedo que a vida não passa de uma armadilha que não falha.
Depois de ler noticias tristes sobre a região no jornal, mas uma vez o coronel fica saudoso dos tempos em que a vontade de coronel era lei sob comando de revolver e do rebenque e hoje o infame do Governo plantou por todos os lugares seu domínio.
E define os outros tempos:
O primeiro é Fernandinho filho que o coronel desejava advogado e hoje não enverga o anel de doutor argumentando que quem identifica o homem são seu próprios atos e, contra a vontade do pai, vivia defendendo os trabalhadores como gente massacrada.
Outros tempos é também quando o filho sugere  que o pai seja iniciador do processo de redistribuição de terras, mas seu pai expulsa-o para que esse vá pregar seu comunismo redentor lá na cadeia entre os doidos e os presos.
Depois o conto dedica espaço para a mulher, morta depois de tantas doenças, e da raiva do coronel com pé de cacau. Segundo Higino, maldição, mas a mulher não deixa cortar porque diz que q desgraça não sairá do sangue enquanto houver um dos deles na terra.

Depois Higino vê a família reunida para pedir a divisão  do patrimônio  e
ACODE MEU DEUS QUE HIGINO QUE MATAR TODA A FAMILIA....  O coronel reflete que é a febre do cacau e fala da relação Homem e árvore( Relação importante na história).
Em seguida o conto trata do cacaueiro e depois da morte de Higino:
Pois foi, fecharam-se em paz, definitivamente verdes os olhos.
O coronel Higino não sabia se sonhava ou morria.

Possível questão

Considerando a ambientação da história comente o trecho abaixo:
“Felizes são aqueles que descobrem logo cedo que a vida não passa de uma armadilha que não falha, aqueles que não encontram na morte o pavor de todo coração, os sabedores de que tudo isso aqui embaixo não passa nada mais e nada menos de uma simples travessia e que acreditam nisso aqui como uma passagem que se faz para outro reino com seus grandes pastos verdes onde tudo é alegria e canto e paz e abrigo e fortuna de pássaro na sensação de um vôo perfeito.”
7. O texto do escritor Cyro de Mattos cria diversas passagens sobre o tempo. O que ele retrata quando propõe “Outros tempos”?
O conto, de caráter regional, mesmo discutindo alguns elementos universalistas como o próprio tempo, faz  uma alusão ao tempo da bonança da região cacaueira . Para isso utiliza a árvore de cacau que fica na  casa do coronel que, de  repente,  parou de dar frutos - em outros tempos ela era a marca da abundância do cacau. Também propõe “outros tempos” para mostrar o filho do coronel que estudou e tem uma mentalidade mais voltada  para a divisão de  terras  com os trabalhadores em oposição a mentalidade de seu pai – coronel de  outros  tempos.

COMO UM VELHO SAVEIRO
O narrador começa a história afirmando que está aqui e não está. O lugar que ele visita, o corpo é seu, mas ele não se reconhece. Afirmando assim para o leitor que ele é diferente do outro que veio àquele  lugar em outros  tempos.  Sabemos que a afirmação “os outros tempos” está relacionada à sua vida com a presença de Maria Esther, mulher que tinha mais luz que todos os saveiros do mundo e que chegou a sua vida quando ele estava cansado de tudo e já com esgotamento nervoso. Afirma que ela chegou na hora exata e fez com que sua vida voltasse e  fosse preenchida  por ela.
Em seguida ele conta a tragédia que foi a morte de Maria Esther afogada quando ambos passeavam com um saveiro. E termina lembrando-se das inesquecíveis mãos de Maria Esther que acenaram pela última vez e  afirmando que ele era  agora  como um velho saveiro que jamais  voltará  ao  caminho do mar.




Possível Questão
Retrato


"Eu não tinha esse rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios, nem o lábio amargo
eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas
eu não tinha este coração que nem se mostra
eu não dei por esta mudança tão simples, tão certa, tão fácil
em que espelho ficou perdida minha face?"


 Texto do conto:
“ Estou aqui e não estou. Estou aqui, sei que meu corpo está nesta casa, nesta sala. Vejo as  coisas familiares, os móveis, os objetos, a lâmpada oscilando de leve, o quadro na parede. Sei que sou eu, que os braços longos, caídos,desanimados são meus braços. Olho no espelho a minha face, reconheço o olhar vago, a testa cada dia mais larga, aboca descaída nos cantos, a barba azulando sobre o queixo e essa palidez de coisa morta, definitivamente morta. Sei que o rosto refletido no vidro é meu rosto, mas não o reconheço.(...) em verdade estou distante, tão distante,no tempo, e no espaço, no passado cada vez mais presente. Olho outra vez a minha face no espelho e nela não encontro desespero, mas somente fadiga e cansaço, irremediáveis e mansos, e imensa solidão”.
10.  O tempo já foi cantado pela lira de ilustres escritores da literatura nacional e sobre o tempo, Cecília foi uma das que mais se notabilizou. O Autor  Dias da Costa também faz em Como um Velho Saveiro... uma reflexão semelhante a da autora no texto Retrato. Após ler o trecho do autor comente sobre ele responder ou não a pergunta feita por Cecília em seu texto.
A pergunta  de Cecília pode ser claramente  respondida no conto, caso  fosse um questionamento do autor, porque, na narrativa , ele nos permite perceber  que  parte de  sua identidade e existência se relacionavam a presença de Maria Esther em sua vida. Ela foi a mulher que lhe curou o nervosismo e quem preencheu, com  sua presença, a vida do narrador.
11. Apesar de ser construído em forma de imagens é possível perceber alguns elementos concretos na história. E, em conhecê-los é possível explicar a imagem final de  como um velho saveiro que jamais voltará ao caminho do mar. Qual seria?
O narrador, ao contar da importância de  Maria Esther e  a tragédia de sua morte,  deixa  claro  que ele é o velho saveiro que ficará para sempre perdido . Isso pode ser afirmado porque, na história, a mulher amada, em  outros tempos, tinha trazido sentido  para sua vida que estava perdida e  foi quem o curou do diagnóstico  médicos  de  nervosismo.
O ALEIJADO

É um conto em que a autora Elvira Foeppel vale-se dos detalhes psicológicos dos personagens para explanar as tristezas e frustrações pessoais desses indivíduos. Partindo da idéia dos traumas e decepções, a história decorre com um profundo abismo afetivo entre mãe e filho, em que estes, mesmo diante do sentimento de cuidado, se veem anestesiados para as manifestações amorosas. O conto apresenta uma doença física real do personagem filho aleijado, mas utiliza também, de forma sutil, o "aleijamento do interior", do abstrato, dos sentimentos contidos. Para tal situação é que  a autora utiliza-se das análises psicológicas .
O menino aleijado: aleijão desde o nascimento vive o clima rude numa luta entre ele e a rotina sem afetos "(...)todos os dias mantinha-se assim em posição de queda, uma fisionomia compondo-se de tonalidades diversas, untos de reserva, humilhação, mãos paradas,inertes, lembrando bichos mortos, formava um conjunto feio,(...) o filho pouco a pouco chorou,lágrimas miúdas, colocava bandejas na mesa, um cheiro de pomada tomando conta de tudo, o filho murcho atravessa sozinho o cruzamento da sala, (...), aos treze anos, o entusiasmo perde-se nas linhas da voz limitada, rouca, terrível o desprezo no canto dos olhos, -a fotografia não existe em casa- o corpo do filho é mistério na rua, é sombra transparente no chão, não atraiçoa ninguém, (...) exausto da normalidade do dia longo, ele quer ser simplesmente criança". Em meio a um ambiente isolado das alegrias de criança, o aleijado é a figuração da doença física e do desprezo social . " engrandecendo-se sozinho no silêncio, modesto,calando miséria,revolta", carrega o desejo oculto de ser feliz ,como qualquer outra criança de sua idade, sufocado pela vida solitária tanto em casa como na rua.
Observe que a UESB fez questão de ressaltar em seu vestibular a ideia de inclusão de dessa relação de uma criança especial. Esse menino prestar-se-ia também a essa discussão.
A mãe: "E naturalmente ela é mãe observada por alguns, cheirando a eucalipto vários dias, acima de tudo ela possui uma experiência de eternidade na carne que chorou este medo, esse pranto, de ver nascer um filho lentamente, sem estar preparada em nenhum instante, em nenhum sentido, em qualquer hora para ter um filho, mesmo assim, ele surgiu, vindo diretamente do seio tomando petulantemente razão de ser, entre lama e luz e o primeiro susto , A CARNE DEFORMADA, mole" . Em situação não muito diferente é retratada a mãe,mulher jovem e vaidosa diante de uma gravidez inesperada marcada definitivamente pela desilusão amorosa, medo, tédio e angústias com um filho deficiente físico.
Marcados por "dois mundos fechados" a mãe mesmo diante da dor dos seus tomentos e do seu filho reflete-se para o mundo numa indiferença "chora, é mãe, sim. Chora ainda, atrapalha-se em ver pasmada a vida curta do filho em transes de angústia, espanto (...), lágrimas na face onde o orgulho se fecha tenso, doloroso, nem grito de mãe, nem zombaria de meninos -HORIZONTAL É LINHA DE INDIFERENÇA, O MUNDO ALI, FECHADO."

Possível Questão

Apesar de ser a história do menino Elvira Foeppel nesse texto constrói nas entrelinhas a história da mãe, o que amplia o conceito de aleijado aplicado ao menino.
12. Comente a afirmação acima
Ao contar a história do seu filho a mulher também conta de si, de sua aventura com o vizinho, de seu pouco amor àquela criança e de seu despreparo para lidar com uma criança deformada. Revela-se  uma mulher  vaidosa  que não sorria ou chorava para não  estragar sua beleza e sobretudo percebe-se  que  a deformação não é só do filho, mas de  das relações e do vínculo estabelecido  entre a criança e a mãe.

TUPAC AMARU
Conta a história de um amor vivido por uma índia que se apaixonou por uma branco. A índia é narradora-personagem e dá ênfase aos sentimentos e sentidos que fundamentam o fim dela, pois por perder seu amor, mesmo sabendo que não era a única para ele, morre após ver a morte do amado nas mãos dos inimigos dele. Ela se considera morta e sempre à procura do amado, tendo como base a característica do amado de “arrogante coragem de varão”.
É possível estabelecer uma relação entre essa história e Iracema de José de Alencar em relação a forma de expressão do amor da figura feminina - de adoração.
Possíveis Questões

A narrativa se inicia tratando da grandeza de Tupac Amaru e que, no entanto quando índia (narradora) o despojava de seus trajes ele era apenas seu homem, mas quando seu rei foi pego, subjugado a outra cultura, inclusive religiosa e, humilhado em frente a seus súditos ela, depois de ter visto tudo, morre.
13. Essa morte é real ou apenas simbólica?
A morte da índia deve ocorrer fisicamente já que o que vaga pelo mundo é sua essência, no entanto a ênfase que o texto é  de  sua morte, depois da morte do  seu rei e do seu homem – este que  dava sentido à  sua vida. Ela afirma que o fim do seu amado nas mãos do estrangeiro fez com que seu corpo explodisse em partículas  sangrentas  e que sua essência vaga na busca de encontrar guerreiros  corajosos  como seu amado.
14. É possível estabelecer uma  relação entre Tupac Amaru e  I Juca- Pirama?
A obra de Gonçalves Dias conta de um ritual antropofágico envolvendo a tribo vitoriosa Timbira que comeria a carne do prisioneiro da tribo Tupi. Já a história de Tupac Amaru possui elementos como a presença do estrangeiro e o amor de uma índia que  vaga  pelo mundo na busca de encontrar a essência do ser amado. Tais distinções colocam as narrativas em temáticas distintas apesar de possuírem como personagens o mesmo grupo social – os índios.
AS CURVAS DA TOCAIA DO ALTO DA MARAVILHA
O conto é construído em forma de relato e a voz principal é a do neto do coronel Asclepíades. A narrativa se inicia com a afirmação do neto de que não podia se queixar da vida: tinha carro, motorista e telefone celular. O motorista era Tibério Boa Morte homem de confiança do avô que tinha pago um justo preço pelo título de coronel para ele e, de capitão, para seu capataz e só não ergueu uma altar para sua mulher porque não teve autorização do Vaticano. Veja mentalidade dos donos das terras do cacau:
...Pena que o Vaticano não me autorize a erigir-lhe um altar.
- Há de permitir – tornou meu avô – Quanto o Vaticano cobra por um altar?
- Não cobra – disse o padre – Isso não se vende. É prêmio.
 O neto narrador conta da casa-grande, hoje vazia, e seus velhos personagens incluindo a finada Marcelina, sua ama, Tio Rufino que gostava da não existência de pretos na fazenda (antiga senzala), o Avô a lembrar-se da sua amada e as raras festas em que Tibério Boa Morte e o turco Jamil sentavam-se à mesa. E a casa-grande é gradativamente definida como “No Silêncio da casa-grande....No vazio da casa-grande”.
Veja como o narrador apresenta a questão de Tibério Boa morte:
Tibério não tinha motivo para voltar. Sequer pelo coronel, por quem sujara as mãos e não as limparia facilmente: sangue alheio, inocente, parecia escorrer-lhe entre os dedos. Se falasse (se dissesse que os mortos não eram seus, pois nem os escolhera, mas apenas tinha apertado o gatilho, sem que o infeliz tivesse tempo de perceber que ia morrer), sujaria o coronel tão reverenciado.
....
E havia ódio agora ao coronel. Sabia que, ia compreendendo, o induzira ao crime. E mais: ensinara-lhe a manejar uma arma de fogo.
O conto, após a morte do coronel, vai revelando todo o pensamento e angústia de Tibério sobre as mortes que realiza  e termina por Tibério, mesmo se sentimento pesado com os  sangue que carrega, concluir que “ Eu não era eu. Era ele. Referindo-se ao coronel  porque seu dedo apenas apertava o gatilho. Apesar de em outros momentos da história essa condição lhe fazer se sentir culpado.
Depois o narrador entra em memórias para falar da escolha familiar para a carreira política dele por ser um orador de cemitério e chega a nos contar de sua ausência de cultura e de gramática.

Quando dirige para  o narrador - neto do coronel - Tibério passa pelo Alto da Maravilha ( veja a ironia) morro que é sugerido como lugar de matanças. Para e atira em dois urubus. Não acerta (nunca tinha errado um tiro) sua frio e treme, mas o neto do coronel diz que ele não precisa temer porque nada lhe acontecerá.
Tibério não tem tanta certeza porque se lembra da quantidade de famílias que  ele deixou sem seus entes queridos.

Possíveis Questões
A história termina com a seguinte reflexão:
Havia de ser outra a cidade. Na Praça do Comércio, havia um coreto de teto amarelo, de azulejos pálidos como se tivessem sido brancos um dia, e talvez já não existe e assim, também ali, adormeçam gritos e gestos de um menino muito antigo, medos e lágrimas de um jagunço que nem parece que foi, mas meu avô sobrevive na cadeira de rodas vazia. E no retrato da sala de visitas – o bigode farto e branco, o olhar grave, mofando na parece. E apenas pó nas mãos do coveiro Zé Maria.
15. Comente sobre o menino muito antigo e os medos e lágrimas de um jagunço propostos na reflexão acima tomando como base a narrativa de Guido Guerra.
O menino é o próprio narrador que constrói uma história sobre um tempo em que habitava a casa-grande de seu avô e recebia os carinhos de Tia Eulina que tomava seu rosto pelas mãos e lhe afagava. E é na voz do narrador que se apresenta como menino antigo que conheceremos o temido Tibério Boa morte que  depois da morte do coronel desaprendeu a atirar e perdeu a admiração pelo coronel que lhe fazia de gatilho.

 O conto faz a denúncia de como se estabelecia as coisas nas terras do cacau e retrata uma personagem que compõe a escala social da hierarquia do cacau.
16. Comente a afirmação acima tomando como base o conto e seus conhecimentos de história regional.
 O texto apresenta a figura do jagunço Tibério Boa Morte como parte importante da forma como se estabelecia as leis na terra do cacau. Ele é no conto aquele que mata a mando do coronel. O texto afirmar que tal homem era um exímio atirador - nunca tinha errado um alvo. No entanto, a história revela a voz do jagunço que não tinha consciência de seus atos sendo apenas as mãos do coronel quando tira a vida de pessoas  sem  conhecê-las  ou saber o motivo. Depois da morte do coronel ele começa a refletir sobre sua condição e termina por definir que o culpado de todas as mortes era mesmo o coronel. Mesmo sendo ele a leva o peso

A CASA É A CASA/ Possíveis Questões

17. O texto de Helena Parente faz a leitura de dois tempos e apresenta  interlocutor(es) que conversam com a dona da casa. Quais são esses dois tempos e em qual está os interlocutor(es)?
O texto apresenta o presente com a  casa vazia e  o passado, lugar onde viveu sua  família . As amigas que  falam com a dona da casa estão no presente tentando convencer a personagem a deixar a casa vazia para morar próximo delas , num apartamento no Leblon.
18. É possível perceber a história da vida da mulher através de imagens relacionadas a casa. Apresente sua trajetória apresentando imagens que comprovem suas afirmações.
Quando recém-casada a dona da casa recebe as primeiras margaridas colhidas e colocadas na mesa para dois: ela e o marido. Ambos compartilham o café antes do marido sair para o escritório. Depois, a casa lembra seus filhos, ela está vestida de branco e empurra um carrinho de bebê. A casa também presencia o casamento da filha e as imagens que ficam é da festa que resplandece sobre as  paredes  e as flores que foram arrumadas no altar feito na sala. Ela de novo se vê de branco empurrando um carrinho de bebê, dessa vez do neto entre os canteiros da casa, Mas  também a casa a vê vestida de  negro  quando segura a mão ausente  do marido.

“Por que você ainda não arrumou suas coisas no apartamento? Por que você só pendurou na parede o quadro de flores? Por que você não quer receber suas amigas? Por que você não quer ir caminhar no calçadão? (...) Pelo amor de Deus, você não se lembra de nós? Ouça, nós somos suas melhores amigas, vamos indicar um tratamento para você e só queremos o seu bem. Sobretudo agora que você está perto de nós, morando no Leblon.” 
19. O que se pode entender do texto acima que finaliza o conto A casa é  a casa?
Fica claro que a solução das amigas não é o melhor para a mulher - ter mudado de  casa não trouxe para ela o ânimo que  as  amigas imaginavam que traria. Uma  prova disso é que ela não sai com as amigas  para viver  uma nova  vida. Assim, a casa é mesmo a casa quando se constrói uma história nela e trocar de  casa não apaga a memória.
O OUTONO DO NOSSO VERÃO

O narrador conta que ele e sua amada viram o verão se despedir e só depois do avançar da narrativa é que entenderemos que as estações ora são aplicadas em sentido real, ora são aplicadas em sentido metafórico na história.
 Ele se encontra no mesmo hotel que estiveram no verão passado,mas sem ela,no começo de mais um verão. Embaixo de sua janela a galera jovem e os bares já se movimentavam e ele sabia quais seriam as reações de desaprovação dela ao barulho e a roupa curta se ela estivesse ali. Lembra que nas últimas agonias do verão passado o mar estava cobre e hoje está azul. Ao se hospedar novamente no hotel que estiveram, lembra que na época só tinha os dois de hospedes e hoje está cheio.
Passou por todas as localidades do braço do mar e acabou parando no mesmo bar de estrada para tomar café onde os dois tinham parado percebeu que o dono ainda era o mesmo como o gerente do hotel é mesmo português. No quarto ele se lembra do último verão. Sabia que se ela estivesse ali começaria a se preparar para dormir e fazerem as contas se ela estava fora de perigo para se entregar ao amor ou não. Sairia da janela e a encontraria dormindo com  roupa de viagem. Se sentiria sozinho.
Ela volta e meia reclamava das dores no baixo ventre da meia idade e voltava a dormir. Ele quando tentava qualquer coisa com ela, ela resmungava  “vá pegar uma puta!”. Depois o narrador começa a dizer que há  falta de opções nas pequenas cidades de férias. Afirma que se morasse numa cidade como aquela enlouqueceria,mas que ainda assim cidades pequenas são a salvação da família brasileira porque causam menos estragos ( sobretudo na moral). Diz que se despediram no verão naquele mesmo braço de mar. O outono e o inverno o atormentaram  mas agora o verão que o machuca pois tem consciência que a saudades e lembranças que tem dela o consome.

Possíveis Questões
20. Além de propor esse título de sentido conotativo, o autor constrói um texto para um interlocutor específico. De quem se trata e sobre o que é a história?
As estações do ano na história se relacionam ao casal, logo o título sugere um relacionamento que se finda e o narrador conta, na história, uma visita que faz a um lugar com a mulher quando sua relação estava no verão, ou estavam unidos. Parte da história é como as coisas estão diferentes - o hotel  que agora  estava cheio e que eles visitaram vazio, e como outras  permanecem iguais  -  o bar da beira da  estrada com o mesmo mulato.  Termina a narrativa afirmando estar no verão daquele lugar, mas ele em si é inverno de ausência do ser amado.

CASA DOS TRINTA/ Possíveis Questões

21. O autor começa por dizer que criar uma academia não é uma idéia original, diz que no Brasil inclusive possui muitas e não somente de letras literárias o que seria perfeitamente plausível a criação de uma academia dos trinta. O que nela de pouco comum? É possível perceber uma certa ironia machadiana na construção dela. Comente também.
A narrativa afirma que há dois grupos de pessoas no mundo: os acadêmicos e os que desejam ser. Acrescenta que no Brasil há várias academias e inclusive de letras. Ainda  afirma que aqui é o pais do mundo que mais dispõe de escritores. Essas ironias e valores dados a aparência, ser acadêmico e intelectual  é um traço machadiano . Esse escritor considera que  o sucesso do homem está em parecer , em brilhar. Vale  ressaltar porém que no caso dessa academia trata-se da reunião  dos marginais da  cidade.
22. No texto, Herberto Sales apresenta uma justificativa, segundo ele, histórica para o fato de não sermos leitores. Qual seria?
Ao brincar com a idéia de que no Brasil há muitos escritores o autor justifica assim que por isso há  poucos  leitores.
23. O que o autor quis dizer com o trecho: “oh, a derrota! Vaidades feridas, frustrações, ressentimentos. Não havia dúvida: a Casa dos Trinta, conquanto fosse uma academia diferente, era uma academia como outra qualquer.”
Sugere aqui que mesmo sendo uma academia de marginais, com homens  não letrados, o principio da   academia era o mesmo: lugar de vaidades.
 24. Que tipo de denuncia aparece no texto relacionada ao carnaval?
Há no texto uma clara associação entre o carnaval e os marginais. Quando  apresenta o banqueiro do bicho como  era um contraventor  eleito presidente  de  uma agremiação carnavalesca, cargo que  levou até a morte.
HORÁRIO DE EXPEDIENTE/ Possíveis Questões

Dr. Mariano, homem por natureza morigerado e paciente, mesmo levando-se em conta o tempo que já passou a esperar, não se apressa, tanto mais que sendo a única pessoa a esperar audiência fatalmente acabará por ser recebido conforme imagina. E assim se deixa ficar, mudando discretamente de posição na poltrona a intervalos (....)
.......................................................................................................................................................................
Serenados os ânimos, ouve-se apenas a longínqua voz do Dr. Libório no interfone; percebendo que ninguém lhe dá atenção, ele tenta abrir a porta do seu gabinete para saber o que estava acontecendo na ante-sala;mas inutilmente, porque a porta já está inteiramente bloqueada por uma montanha de livros empilhados.
25. Os trechos acima revelam dois momentos distintos na história no que se refere a forma como Dr. Mariano está ocupando o escritório de Dr. Libório. O que há de diferente?
Hora do expediente é uma  clara  história de paciência  como condição de  ocupação dos  espaços. Assim o primeiro trecho revela Dr. Mariano numa longa espera para falar com Dr. Libório ocupando apenas uma cadeira, já o segundo texto revela Dr. Mariano dominando todo o espaço do escritório do Dr. Libório e esse, preso em sua sala.
26. É correto aplicar ao texto a idéia de que a paciência do outro e o relapso na ocupação de nossos espaços podem nos levar a perder território?
Se considerarmos que Dr. Mariano começa a história esperando num pequeno espaço para ser atendido e depois gradualmente vai chegando mais cedo, trazendo trabalho, depois trazendo assistentes, material de escritório para trabalhar enquanto espera e  um cronograma de  trabalho seguido inclusive pela secretária de Dr. Libório  e mais, se atentarmos para o final da história em que é Dr. Libório, em seu próprio escritório, que  tenta marcar  uma audiência  com Dr. Mariano é  possível perceber que a não ocupação de  nossos espaços permite que o outro possa alojar-se.
A CAMPAINHA ASSASSINA/ Possíveis Questões


27. Apesar de sugerir que o que mata João Marangávio é uma campainha o autor vai apresentando a personagem de modo a dar ao leitor a oportunidade de entender o tal som apenas como elemento no conjunto de coisas que levam João ao final trágico. Quais são as referências que o texto faz disso?
O autor apresenta João como um semi-analfabeto que se casou com boas intenções, mas mora num terreno invadido, com uma mulher que provavelmente o trai com o guarda. Tinha um trabalho mecânico de ir e vir movido pelo barulho da campainha. Em casa  comia uma comida pobre  com os poucos dentes que tinha e não tinham no casebre nem TV nem rádio. Tentou mudar de trabalho e de vida, mas não havia chances  para ele. Termina tendo pesadelos com a campainha  que o despertava e é morto pelo guarda que o confunde a noite  com um malandro.
28. Qual leitura sociológica pode ser feita do trecho abaixo?
Ao longo de vários dias, a conversa girou em torno dos desígnios que transformaram um cidadão humilde num perigoso assaltante noturno. Todos sentenciavam que na vida há fatos inexplicáveis e que é preciso muita cautela com a força dos astros diante do destino frágil dos homens. Na rotina dos dias imprevisíveis, um novo servente, aprumado na saleta, começava a ser massacrado pelo som da companhia que transformara, aos poucos, num inferno sem remissão, a vida do infeliz Marangávio, morto a bala no meio da rua, apesar da sua conduta de ‘pacifico cidadão exemplar’ – como dizem, com gravidade, os patrões benevolentes, e acabou constatando dos seus últimos registros profissionais.”
João é apenas a representação de um trabalhador que é parte da engrenagem do mundo de  trabalho mecanizado. Sua morte será motivo de conversa, mas ele será imediatamente  substituído por outro que ocupará seu lugar e será explorado da mesma maneira se transformando brevemente em João.

ALANDELÃO DE LA PATRIE/ Possíveis Questões
29. O conto, apesar de ser uma história que envolve animais, é em sua profundidade uma análise de raças. Que opinião o narrador propõe sobre as raças expostas no texto?
Ao propor a superioridade de bois europeus nos tratamentos que esses dão as vacas, e em apresentar Alendelão como um boi francês tão superior que seu sêmen não deve ser  desperdiçado em um ato sexual , ou que o boi holandês é muito educado e são contrários ao Guzerá que tem cara de ordinário, mentirosos, criminosos e cínico. O narrador não nos propõe apenas a história de um boi  de raça, mas  a superioridade das  raças  européias em sua formação, o tratamento que dão e  como se diferenciam dos  bois-pessoas  de nossa  terra. 

O APITO
O conto "O Apito" se baseia na chegada de um grande navio estrangeiro no porto de Ilhéus, além de retratar como personagem principal um menino do interior baiano que era aficionado em ver barcos e navios no porto marítimo. E seu sonho era ver um grande navio estrangeiro de perto, e poder entrar neste, além de falar para todos em sua cidade o que conseguira. Entretanto, o navio esperado por todos não desembarcou no porto, parou muito longe, e apenas pediu a presença de um médico a bordo, que foi de barco ao encontro do navio.
No final do conto, um trabalhador retrata que o povo de Ilhéus é muito "enxerido", que espalharam que o navio trazia um coronel, e que era uma invenção de quem não tinha com que se ocupar. E, tristemente, o menino saiu do porto, levando na lembrança apenas o apito do navio, e comparando-o com o aboio dos vaqueiros que passavam em Água Preta.


Possíveis Questões
30. O Conto apresenta a história de um menino que sonhava em ver um grande navio no Porto de Ilhéus. Tal sonho não se realiza e o motivo foi inclusive um dos temas desencadeadores do romance Gabriela: cravo e  canela de Jorge  Amado. De que questão se trata?
A trama de Jorge se desenvolve em torno da reforma do porto para receber navios que escoariam o cacau direto do porto de Ilhéus  para a Europa e resolver o problema do encalhe de navios no porto do Pontal. O principal fato deste conto é a incapacidade do porto de Ilhéus para receber grandes embarcações por isso o menino não pode ver o grande navio. Assim, as histórias tratam  da mesma questão – a  ampliação do porto de  Ilhéus.
ALMOÇO POSTO NA MESA/ Possíveis Questões


O conto Almoço posto na mesa apresenta a história de um casal simples, que em um determinado dia no almoço o personagem Joaquim decide comer o próprio corpo. Ele começa colocando a língua no prato e assim sucessivamente devora-se até sobrar a boca que se mastiga sem nada acima ou abaixo. Sua esposa presencia o fato e não se espanta, ao contrário quando o marido acaba ela começa também a comer o seu corpo, mas começando pelo seu órgão genital porque segunda a sua mãe era ali o começo e o fim.
31. É correto afirmar que a construção desse conto é feita com elementos fantásticos? Justifique.
O texto propõe que a personagem senta a mesa  para almoçar  o próprio corpo começando pela língua. Não interrompeu tal ritual nem mesmo quando um carro invadiu a  casa, momento em que ele comia o pé que tanto lhe atormentava com suas joanetes e cravos. Tais imagens também aplicáveis a mulher que passará a  comer-se depois, não na mesma ordem do marido, nos permite  perceber que o elemento do fantástico ou do não comum é utilizado na construção da história.
UM CASO COMPLICADO/ Possíveis Questões

“Afinal, porque gritavam tão alto, porque choravam e se maldiziam aos brados, o que diziam de monstruoso e terrível  que não percebia?
O sol incidiu vigorosamente nos vidros da clarabóia, o quarto suspenso em luz, nave espacial de transparência opaca, parados os ponteiros dos relógios, o tempo aprisionado naquele espaço,domado no seu corcovear de cavalo enfurecido.”
32. Considerando a totalidade do conto, o que levou ao espanto, às pessoas que viam essa cena?
As pessoas se chocaram ao perceberem que o narrador da história estava empalhado tal qual os animais que  ele costumava empalhar. No entanto ele não se dá  conta dessa  condição nos permitindo  ler nas entrelinhas  do  conto a intenção da autora em propor uma história de  amor e dedicação a uma profissão de  forma a anulação de vida. Assim é  com  o amante de taxidermia que não se importa  com amigos, anula-se da família e termina por ficar igual aos  animais que trabalhava.  

FELIZ ANIVERSÁRIO!/ Possíveis Questões

O jantar transcorreu na mais perfeita harmonia. Ela sorriu, gesticulou muito, contou coisas de si. A criada apenas ouvia. Perplexa. O fato é que a inesperada ausência  do convidado, tão ansiosamente esperado, não pareceu tê-la entristecido nem um pouco.  E se isso aconteceu, passou bem rápido. Estava disposta e bem humorada. Um tanto esquisita essa patroa...”
33. A naturalidade com que a personagem lida com a ausência do convidado no seu aniversário pode ser vista pela perspectiva da empregada?
A história gira em torno de uma mulher solitária que em todo aniversário pede a empregada para preparar-lhe o jantar. Na ocasião envia flores a si mesma e  arruma-se  para receber  um namorado. Quando ele não chega ela ceia com a empregada. O não entendimento da empregada sobre como a patroa lida com naturalidade com a ausência é perfeitamente plausível já que a mesma não sabe que desde a arrumação do jantar a personagem já sabia que  tal namorado  não viria e a empregada, após o jantar é despedida e, no ano seguinte, uma nova é contratada.
O DESEJO E SUA DANÇA/ Possíveis Questões

“Elvira estava próximo ao desespero porque ia completar trinta anos de idade e ainda era virgem. Mas preferiria morrer a declarar tal desespero a alguém. Para serenar seu desejo de homem, costumava dançar sozinha, trancada no seu quarto.”
34. A personagem acima foi construída numa história que revela um teor religioso/mitológico sobre sua personalidade. Explique tomando como base o conto.
O narrador propõe para Elvira duas personalidades: a mulher recatada, educada que cedia lugares para as  pessoas mais velhas e andava de cabeça baixa e a Elvira de  casa que bebia, vestia-se de forma extravagante, dançava e xingava. Essa dupla personalidade foi explicada num terreiro quando soube ser filha de um orixá que fazia com que ela passasse despercebida pelos de fora porque estava reservada a um homem também escolhido como ela. Depois de ouvir explicações a jovem decide deixar a universidade  e  seguir seu caminho de filha de  santo.
EMÍLIA/ Possíveis Questões

Então ele sentiu dois punhos nas costas:
- Covarde!
Agora, contra o peito:
- Covarde! Covarde!
Ela nunca estivera tão próxima. Recuou, tonto, a vida para sempre desgraçada.
35. No contexto do conto explique o trecho “ a vida para sempre desgraçada.”
O menino nutria uma paixão platônica pela menina Emília que no seu imaginário era a mulher ideal e para ela mudara de comportamento. Chega mesmo a se arrumar e passar os dias brincando próximo a ela. Quando teve a oportunidade de aproximar-se ,num piquenique, seus amigos, no momento em que  quase ia tocá-la, lhe jogou água e lama destruindo aquele momento que para sempre seria uma doce lembrança em  sua memória.


A OUTRA PONTA DO ARCO-ÍRIS/ Possíveis Questões

- Na vida, minha senhora, há lugar para tudo e para todos e ninguém é dono do saber. Para mim, a Medicina é um homem velho...
- Não doutor. Não é assim. A Medicina é saber dos homens. Mas os homens não sabem tudo.  O Senhor deve continuar curando. A humanidade ainda precisa do seu saber. Tenha paciência consigo mesmo, doutor. A misericórdia divina está acima de tudo.
- Talvez a senhora esteja a certa. Mas o certo é que minha visita e de reparo.
36. Considerando o trecho “visita de reparo”. Comente sobre a mudança de postura do médico no conto.
O conto propõe a trajetória de um  médico que persegue a mãe de Santo a  ponto de ir acompanhado da polícia buscar um paciente em seu terreiro. No entanto algumas adversidades em sua vida como a perda  do filho associado a um pesadelo que teve lhe permite refletir sobre as crenças da  mãe de  santo sendo capaz de perceber nas histórias dos mitos africanos , uma aproximação com os mitos gregos. Dessa maneira, a construção do respeito do médico é, por extensão, um convite do escritor para que os letrados leitores também vejam a cultura africana  por essa  prisma.
NA PENUMBRA/ Possíveis Questões

“ A respiração do homem vai ficando mais regular e ruidosa. Quando percebe que ele dorme profundamente, a mulher desprende-se devagarinho  do seu abraço e fica observando-o. Depois se aproxima, beija-o de leve nos lábios. Com uma das mãos, acaricia-lhe o rosto, com a outra vai explorando o fundo poço do seu próprio sexo, numa lenta exploração de prazer.
- Papai, papai – ela murmura, olhando para o homem adormecido.
37. A imagem proposta acima pode ser entendida como patológica?
O homem que dorme não é o seu pai, mas um jornalista do interior que chegou recentemente à cidade grande para tentar a vida. Ela, uma mulher  casada que vive bem economicamente, mas que ali está  para contar do abuso sexual do seu pai. O jornalista, comovido com a declaração e ansioso por apagar da memória da moça tais imagens, promete-lhe  que vão começar  uma nova vida. Quando esse adormece a moça o chama de pai numa clara demonstração de que ainda enfrenta problemas psicológicos  com aquela questão.

UM SAVEIRO TEM MAIS VALIA/ Possíveis Questões

“Quando o viu, a nado e safo, embora de mastro quebrado, sem os panos, um rombo no casco, com metade nágua – mas mesmo assim, cheio de dignidade – só então lágrimas afloraram nos olhos de Maria.”
38. O termo “só então” sugere que houve outras coisas que ocorreram. Quais seriam?
O trecho -  desfecho da história, é uma clara demonstração de solidariedade dos marinheiros que deixaram  de ir pescar para salvar  um saveiro que simbologicamente seria ajudar pessoas. O casal enfrentou um vendaval e sobreviveu a noite no mar, estando a mulher grávida. Ela  passou por tudo isso e  só chorou ao  ver o barco sendo tirado das águas. Sua emoção está relacionada a perceber que há ainda entre os homens solidariedade.