sábado, 30 de novembro de 2013

UESB Clepsidra comentado por Mara Rute

Clepsidra


Primeiras Palavras
Alunos do curso de Itabuna, Mara Rute e o professor Jackson Lessa
"... ensinou a sentir veladamente; descobriu-se a verdade de que para ser poeta não é mister trazer o coração nas mãos, senão que basta trazer nelas a sombra dele. (...) Estas palavras que são nada bastam para apresentar a obra do meu mestre C. P. O mais que é tudo, é Camilo Pessanha." (Pessoa 1974)

Quando vi na lista da UESB o livro “Clepsidra” notei que esse seria tão qual foi “A Invenção de Orfeu” o maior desafio de leitura para vocês. Então comecemos por ele. Afinal, estamos tratando da leitura de poemas, coisa rara nos dias de hoje em que não se escreve mais por imagens e não se tem tempo para a poesia. No mais, o desafio seguinte é que se trata de um autor didaticamente inserido num dos período s menos estudados e não tão simples da literatura – o simbolismo, e entender um autor que não está inserido na literatura brasileira. Posto os desafios é a vez de estabelecer as formas de vencê-los.
ü  Conhecer o momento histórico-literário em que se insere o autor.
ü  Entender um pouco da história desse escritor de um só livro que abalou as estruturas poéticas de seu tempo.
ü  Conhecer alguns estudos teóricos sobre Camilo Pessanha.
ü  Ler seu livro com ênfase em alguns poemas estabelecendo comparações com escritores brasileiros que poderiam, por temática ou características, aparecerem na prova.
ü  Responder algumas questões do conteúdo para ver como o escritor já foi cobrado em processos seletivos.

Estabelecido a forma didática de como vencer vamos começar? Abaixo segue os poemas com uma marca de seleção nos que vocês devem fazer uma leitura mais ampliada.


http://blog.unica.br/wp-content/uploads/2009/10/3d-human-with-big-positive-symbol-in-hands.png1 INSCRIÇÃO
Eu vi a luz em um país perdido.
A minha alma é lânguida(fraca) e inerme(indefesa).
Oh! Quem pudesse deslizar sem ruído!
No chão sumir-se, como faz um verme...
A presença do verme e a visão pessimista característica do simbolismo também aparece na poética de Augusto dos Anjos e em Machado de Assis.
Vamos ler e comparar?
O DEUS VERME

Fator universal do transformismo.
Filho da teleológica matéria,
Na superabundância ou na miséria,
Verme - é o seu nome obscuro de batismo.

Jamais emprega o acérrimo exorcismo
Em sua diária ocupação funérea,
E vive em contubérnio com a bactéria,
Livre das roupas do antropomorfismo.



Almoça a podridão das drupas agras,
Janta hidrôpicos, rói vísceras magras
E dos defuntos novos incha a mão...

Ah! Para ele é que a carne podre fica,
E no inventário da matéria rica
Cabe aos seus filhos a maior porção!

DEDICATÓRIA DO LIVRO DE MEMÓRIAS PÓSTUMAS

“Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas memórias póstumas”.


SONETOS
Você sabe o que é um soneto? Dois quartetos e dois tercetos.
http://blog.unica.br/wp-content/uploads/2009/10/3d-human-with-big-positive-symbol-in-hands.png2 CAMINHO
I
Tenho sonhos cruéis; n'alma doente[1]
Sinto um vago receio prematuro.
Vou a medo na aresta do futuro,
Embebido em saudades do presente...

Saudades desta dor que em vão procuro
Do peito afugentar bem rudemente,
Devendo, ao desmaiar sobre o poente,
Cobrir-me o coração dum véu escuro!...

Porque a dor[2], esta falta d'harmonia,
Toda a luz desgrenhada que alumia
As almas doidamente, o céu d'agora,

Sem ela o coração é quase nada:
Um sol onde expirasse a madrugada,
Porque é só madrugada quando chora.

Leremos esse poema para estabelecer a relação entre Romantismo e Simbolismo e ver que algumas imagens e valores aparecem nos dois.

Lembranças de Morrer

Quando em meu peito rebentar-se a fibra,
Que o espírito enlaça à dor vivente,
Não derramem por mim nem uma lágrima
Em pálpebra demente.

E nem desfolhem na matéria impura
A flor do vale que adormece ao vento:
Não quero que uma nota de alegria
Se cale por meu triste passamento.

Eu deixo a vida como deixa o tédio
Do deserto, o poento caminheiro
- Como as horas de um longo pesadelo
Que se desfaz ao dobre de um sineiro;

(...)
Se uma lágrima as pálpebras me inunda,
Se um suspiro nos seios treme ainda,
É pela virgem que sonhei… que nunca
Aos lábios me encostou a face linda!

(...)
Descansem o meu leito solitário
Na floresta dos homens esquecida,
À sombra de uma cruz, e escrevam nela:
Foi poeta – sonhou – e amou na vida.

Sombras do vale, noites da montanha
Que minha alma cantou e amava tanto,
Protegei o meu corpo abandonado,
E no silêncio derramai-lhe canto!

Mas quando preludia ave d’aurora
E quando à meia-noite o céu repousa,
Arvoredos do bosque, abri os ramos.
Deixai a lua pratear-me a lousa!

(Álvares de Azevedo)
http://blog.unica.br/wp-content/uploads/2009/10/3d-human-with-big-positive-symbol-in-hands.pngII
Encontraste-me um dia no caminho
Em procura de quê, nem eu o sei.
­ Bom dia, companheiro, te saudei,
Que a jornada é maior indo sozinho

É longe, é muito longe, há muito espinho!
Paraste a repousar, eu descansei...
Na venda em que poisaste, onde poisei,
Bebemos cada um do mesmo vinho.

É no monte escabroso, solitário.
Corta os pés como a rocha dum calvário,
E queima como a areia!... Foi no entanto

Que choramos a dor de cada um...
E o vinho em que choraste era comum:
Tivemos que beber do mesmo pranto.
Estabeleça comparações entre os textos de Camilo e Vinicius – lembre-se também que Drummond trabalha com a ideia de Caminho – no modernismo vários escritores o fazem.

Soneto de Separação
Vinicius de Moraes

De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto

De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama

De repente não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente

Fez-se do amigo próximo, distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente

http://blog.unica.br/wp-content/uploads/2009/10/3d-human-with-big-positive-symbol-in-hands.pngIII
Fez-nos bem, muito bem, esta demora:
Enrijou(fortaleceu) a coragem fatigada[3]...
Eis os nossos bordões da caminhada,
Vai já rompendo o sol: vamos embora.

Este vinho, mais virgem do que a aurora,
Tão virgem não o temos na jornada...
Enchamos as cabaças: pela estrada,
Daqui inda este néctar avigora!...

Cada um por seu lado!... Eu vou sozinho,
Eu quero arrostar só todo o caminho,
Eu posso resistir à grande calma!...

Deixai-me chorar mais e beber mais,
Perseguir doidamente os meus ideais,
E ter fé e sonhar ­ encher a alma.
O que ele deseja? Qual é seu objetivo? A solidão?
http://blog.unica.br/wp-content/uploads/2009/10/3d-human-with-big-positive-symbol-in-hands.png3 ESTÁTUA
Cansei-me de tentar o teu segredo:
No teu olhar sem cor, ­ frio escalpelo(bisturi),
O meu olhar quebrei, a debatê-lo,
Como a onda na crista dum rochedo[4].

Segredo dessa alma e meu degredo[5]
E minha obsessão! Para bebê-lo
Fui teu lábio oscular, num pesadelo,
Por noites de pavor, cheio de medo.

E o meu ósculo ardente, alucinado,
Esfriou sobre o mármore correto
Desse entreaberto lábio gelado...

Desse lábio de mármore, discreto,
Severo como um túmulo fechado,
Sereno como um pélago(mar) quieto[6].

4 PAISAGENS DE INVERNO
I
Ó meu coração, torna para trás.
Onde vais a correr, desatinado?
Meus olhos incendidos que o pecado
Queimou! ­ o sol! Volvei, noites de paz.

Vergam da neve os olmos (as árvores) dos caminhos.
A cinza arrefeceu(esfriou) sobre o brasido (as brasas).
Noites da serra, o casebre transido...
Ó meus olhos, cismai como os velhinhos.

Extintas primaveras evocai-as:
­ Já vai florir o pomar das maceiras.
Hemos de enfeitar os chapéus de maias[7]

Sossegai, esfriai, olhos febris.
­E hemos de ir cantar nas derradeiras
Ladainhas...Doces vozes senis(velhas)...­

II
Passou o outono já, já torna o frio...
­ Outono de seu riso magoado[8].
Álgido(frio) inverno![9] Oblíquo o sol, gelado...
­ O sol, e as águas límpidas do rio.

Águas claras do rio! Águas do rio,
Fugindo sob o meu olhar cansado,
Para onde me levais meu vão cuidado?

Aonde vais, meu coração vazio?
Ficai, cabelos dela, flutuando,
E, debaixo das águas fugidias,
Os seus olhos abertos e cismando...

Onde ides a correr, melancolias?
­ E, refratadas, longamente ondeando,
As suas mãos translúcidas e frias...

5 SAN GABRIEL
I
Inútil! Calmaria. Já colheram
As velas. As bandeiras sossegaram,
Que tão altas nos topes tremularam,
­ Gaivotas que a voar desfaleceram.

Pararam de remar! Emudeceram!
(Velhos ritmos que as ondas embalaram)
Que cilada que os ventos nos armaram!
A que foi que tão longe nos trouxeram?

San Gabriel, arcanjo tutelar,
Vem outra vez abençoar o mar,
Vem-nos guiar sobre a planície azul.

Vem-nos levar à conquista final
Da luz, do Bem, doce clarão irreal.
Olhai! Parece o Cruzeiro do Sul!
II
Vem conduzir as naus, as caravelas,
Outra vez, pela noite, na ardentia,
Avivada das quilhas. Dir-se-ia
Irmos arando em um montão de estrelas.
Outra vez vamos! Côncavas as velas,
Cuja brancura, rútila de dia,
O luar dulcifica(torna doce). Feeria(tipo de planta)
Do luar não mais deixes de envolvê-las!
Vem guiar-nos, Arcanjo, à nebulosa
Que do além mar vapora, luminosa,
E à noite lactescendo[10], onde, quietas,
Fulgem(brilham) as velhas almas namoradas...
­ Almas tristes, severas, resignadas,
De guerreiros, de santos, de poetas.

6
Tatuagens complicadas do meu peito:
Troféus, emblemas, dois leões alados...
Mais, entre corações engrinaldados,
Um enorme, soberbo, amor-perfeito...

E o meu brasão... Tem de oiro, num quartel
Vermelho, um lis(lírio); tem no outro uma donzela,
Em campo azul, de prata o corpo, aquela
Que é no meu braço como que um broquel[11].

Timbre: rompante, a megalomania...
Divisa: um ai, ­ que insiste noite e dia
Lembrando ruínas, sepulturas rasas...

Entre castelos serpes batalhantes,
E águias de negro, desfraldando as asas,
Que realça de oiro um colar de besantes!

7 MADALENA
...e lhe regou de lágrimas os pés e os
enxugou com os cabelos da sua cabeça.
Evangelho de S. Lucas.
Ó Madalena, ó cabelos de rastos(que deixa vestígios),
Lírio poluído, branca flor inútil...
Meu coração, velha moeda fútil,
E sem relevo, os caracteres gastos[12],

De resignar-se torpemente dúctil(flexível)...
Desespero, nudez de seios castos,
Quem também fosse, ó cabelos de rastos,
Ensangüentado, enxovalhado, inútil,

Dentro do peito, abominável cômico!
Morrer tranqüilo, ­ o fastio da cama...
Ó redenção do mármore anatômico,

Amargura, nudez de seios castos!...
Sangrar, poluir-se, ir de rastos na lama,
Ó Madalena, ó cabelos de rastos!

8  FONÓGRAFO
Vai declamando um cômico defunto.
Uma platéia ri, perdidamente,
Do bom jarreta(antiquado)... E há um odor no ambiente.
A cripta e a pó, ­ do anacrônico(ultrapassado) assunto.

Muda o registo, eis uma barcarola[13]:
Lírios, lírios, águas do rio, a lua...
Ante o Seu corpo o sonho meu flutua
Sobre um paul, ­ extática corola.

Muda outra vez: gorjeios, estribilhos
Dum clarim de oiro ­ o cheiro de junquilhos,
Vívido e agro! ­ tocando a alvorada...

Cessou. E, amorosa, a alma das cornetas
Quebrou-se agora orvalhada e velada.
Primavera. Manhã. Que eflúvio de violetas!
9
Desce em folhedos tenros a colina:
­ Em glaucos(esverdeados), frouxos tons adormecidos,
Que saram, frescos, meus olhos ardidos,
Nos quais a chama do furor declina...

Oh vem, de branco, ­ do imo(interior) da folhagem!
Os ramos, leve, a tua mão aparte.
Oh vem! Meus olhos querem desposar-te,
Refletir virgem a serena imagem.

De silva doida uma haste esquiva.
Quão delicada te osculou num dedo
Com um aljôfar(gota de orvalho) cor de rosa viva!...

Ligeira a saia... Doce brisa impele-a...
Oh vem! De branco! Do imo do arvoredo!
Alma de silfo(espírito elementar do ar), carne de camélia...
http://blog.unica.br/wp-content/uploads/2009/10/3d-human-with-big-positive-symbol-in-hands.png10
Esbelta surge! Vem das águas, nua,
Timonando(dirigindo) uma concha alvinitente(alva)!
Os rins flexíveis e o seio fremente(trêmulo)...
Morre-me a boca por beijar a tua.

Sem vil pudor! Do que há que ter vergonha?
Eis-me formoso, moço e casto, forte.
Tão branco o peito! ­ para o expor à Morte...
Mas que ora ­ a infame! ­ não se te anteponha.

A hidra torpe!... Que a estrangulo! Esmago-a
De encontro à rocha onde a cabeça te há de,
Com os cabelos escorrendo água,

Ir inclinar-se, desmaiar de amor,
Sob o fervor da minha virgindade
E o meu pulso de jovem gladiador.
Excelente referência de descrição da figura feminina nos moldes simbolistas. Vamos analisá-la? E depois  comparar com a figura feminina de Castro Alves?

BOA NOITE
Boa noite, Maria! Eu vou,me embora.
A lua nas janelas bate em cheio.
Boa noite, Maria! É tarde... é tarde. .
Não me apertes assim contra teu seio.


Boa noite! ... E tu dizes - Boa noite.
Mas não digas assim por entre beijos...
Mas não mo digas descobrindo o peito,
— Mar de amor onde vagam meus desejos!


Julieta do céu! Ouve... a calhandra
já rumoreja o canto da matina.
Tu dizes que eu menti? ... pois foi mentira...
Quem cantou foi teu hálito, divina!


Se a estrela-d'alva os derradeiros raios
Derrama nos jardins do Capuleto,
Eu direi, me esquecendo d'alvorada:
"É noite ainda em teu cabelo preto..."


É noite ainda! Brilha na cambraia
— Desmanchado o roupão, a espádua nua
O globo de teu peito entre os arminhos
Como entre as névoas se balouça a lua. . .


É noite, pois! Durmamos, Julieta!
Recende a alcova ao trescalar das flores.
Fechemos sobre nós estas cortinas...
— São as asas do arcanjo dos amores.


A frouxa luz da alabastrina lâmpada
Lambe voluptuosa os teus contornos...
Oh! Deixa-me aquecer teus pés divinos
Ao doudo afago de meus lábios mornos.


Mulher do meu amor! Quando aos meus beijos
Treme tua alma, como a lira ao vento,
Das teclas de teu seio que harmonias,
Que escalas de suspiros, bebo atento!


Ai! Canta a cavatina do delírio,
Ri, suspira, soluça, anseia e chora. . .
Marion! Marion!... É noite ainda.
Que importa os raios de uma nova aurora?!...


Como um negro e sombrio firmamento,
Sobre mim desenrola teu cabelo...
E deixa-me dormir balbuciando:
— Boa noite! — formosa Consuelo.
Castro Alves

11
VÊNUS
I
À flor da vaga, o seu cabelo verde,
Que o torvelinho(redemoinho) enreda(embola) e desenreda...
O cheiro a carne que nos embebeda!
Em que desvios a razão se perde!

Pútrido o ventre, azul e aglutinoso,
Que a onda, crassa(grossa), num balanço alaga,
E reflui (um olfato que se embriaga)
Como em um sorvo(gole), murmura de gozo.

O seu esboço, na marinha turva...
De pé flutua, levemente curva;
Ficam-lhe os pés atrás, como voando...

E as ondas lutam, como feras mugem,
A lia em que a desfazem disputando,
E arrastando-a na areia, co'a salsugem.

II
Singra o navio. Sob a água clara
Vê-se o fundo do mar, de areia fina...
­ Impecável figura peregrina,
A distância sem fim que nos separa!

Seixinhos da mais alva porcelana,
Conchinhas tenuemente cor de rosa,
Na fria transparência luminosa
Repousam, fundos, sob a água plana.

E a vista sonda, reconstrui, compara,
Tantos naufrágios, perdições, destroços!
­ Ó fúlgida visão, linda mentira!

Róseas unhinhas que a maré partira...
Dentinhos que o vaivém desengastara...
Conchas, pedrinhas, pedacinhos de ossos...
12
Depois da luta e depois da conquista
Fiquei só! Fora um ato antipático!
Deserta a Ilha, e no lençol aquático
Tudo verde, verde, ­ a perder de vista.

Porque vos fostes, minhas caravelas,
Carregadas de todo o meu tesoiro?
­ Longas teias de luar de lhama de oiro,
Legendas a diamantes das estrelas!

Quem vos desfez, formas inconsistentes,
Por cujo amor escalei a muralha,
­ Leão armado, uma espada nos dentes?

Felizes vós, ó mortos da batalha!
Sonhais, de costas, nos olhos abertos
Refletindo as estrelas, boquiabertos...
De que maneira esse poema trabalha a ideia da sugestão? De oferecer múltiplas leituras?

http://blog.unica.br/wp-content/uploads/2009/10/3d-human-with-big-positive-symbol-in-hands.png13 OLVIDO ( esquecimento)
Desce por fim sobre o meu coração
O olvido. Irrevocável. Absoluto.
Envolve-o grave como véu de luto.
Podes, corpo, ir dormir no teu caixão.

A fronte já sem rugas, distendidas
As feições, na imortal serenidade,
Dorme enfim sem desejo e sem saudade
Das coisas não logradas(alcançadas) ou perdidas.

O barro que em quimera modelaste
Quebrou-se-te nas mãos. Viça uma flor...
Pões-lhe o dedo, ei-la murcha sobre a haste...

Ias andar, sempre fugia o chão,
Até que desvairavas, do terror.
Corria-te um suor, de inquietação...

http://blog.unica.br/wp-content/uploads/2009/10/3d-human-with-big-positive-symbol-in-hands.png14
Quem poluiu, quem rasgou os meus lençóis de linho,
Onde esperei morrer, ­ meus tão castos lençóis?
Do meu jardim exíguo os altos girassóis
Quem foi que os arrancou e lançou no caminho?

Quem quebrou (que furor cruel e simiesco!)
A mesa de eu cear, ­ tábua tosca de pinho?
E me espalhou a lenha? E me entornou o vinho?
­ Da minha vinha o vinho acidulado e fresco...

Ó minha pobre mãe!... Não te ergas mais da cova.
Olha a noite, olha o vento. Em ruína a casa nova...
Dos meus ossos o lume a extinguir-se breve.

Não venhas mais ao lar. Não vagabundes mais,
Alma da minha mãe... Não andes mais à neve,
De noite a mendigar às portas dos casais.
Vamos  conhecer a poetisa brasileira moderna que tem traços simbolistas?
Retrato

Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios, nem o lábio amargo.
Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração que nem se mostra.
Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
Em que espelho ficou perdida a minha face?

Pus o meu sonho num navio
Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
depois abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar.
Minhas mãos ainda estão molhadas
do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre dos meus dedos
colore as areias desertas
O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho dentro de um navio...
Chorarei quanto for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça.
Depois, tudo estará perfeito:
praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras
e as minhas duas mãos quebradas

Cecília Meireles
http://blog.unica.br/wp-content/uploads/2009/10/3d-human-with-big-positive-symbol-in-hands.png15
Floriram por engano as rosas bravas
No inverno: veio o vento desfolhá-las...
Em que cismas, meu bem? Porque me calas
As vozes com que há pouco me enganavas?

Castelos doidos! Tão cedo caístes!...
Onde vamos, alheio o pensamento,
De mãos dadas? Teus olhos, que um momento
Perscrutaram nos meus, como vão tristes!

E sobre nós cai nupcial a neve,
Surda, em triunfo, pétalas, de leve
Juncando o chão, na acrópole de gelos...

Em redor do teu vulto é como um véu!
Quem as esparze ­ quanta flor! ­ do céu,
Sobre nós dois, sobre os nossos cabelos?
Veja que cena interessante esse poema compõe


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[1] “alma doente” característica também do romantismo.
[2] A importância da dor. Comparável com Alvares de Azevedo.
[3] Note o jogo de palavras
[4] Explique essa comparação.
[5] Explique o sentido de degredo aqui
[6] Explique a utilização das imagens do texto justificando o seu título
[7] Festa popular portuguesa que acontece na primavera.
[8] Explique o sentido de outono no texto
[9] Percebe a repetição de imagem?
[10] É uma característica do simbolismo o uso de variações de palavras relacionadas ao branco.
[11] Escudo. Poemas que inauguram o Simbolismo no Brasil – Missal e Broquéis
[12] Observe a descrição que ele faz de seu coração.
[13] Poesia cuja cadência de versos procura reproduzir o compasso dos remos venezianos batendo na água.